"Nós não somos seres humanos tendo uma experiência espiritual. Somos seres espirituais tendo uma experiência humana"

(Teillard de Chardin)

10 janeiro 2017

A triste geração que tudo idealiza e nada realiza



Demorei sete anos (desde que saí da casa dos meus pais) para ler o saquinho do arroz que diz quanto tempo ele deve ficar na panela. 

Comi muito arroz duro fingindo estar “al dente”, muito arroz empapado dizendo que “foi de propósito”. 

Na minha panela esteve por todos esses anos a prova de que somos uma geração que compartilha sem ler, defende sem conhecer, idolatra sem porquê. 

Sou da geração que sabe o que fazer, mas erra por preguiça de ler o manual de instruções ou simplesmente não faz. 

Sabemos como tornar o mundo mais justo, o planeta mais sustentável, as mulheres mais representativas, o corpo mais saudável. 

Fazemos cada vez menos política na vida (e mais no Facebook), lotamos a internet de selfies em academias e esquecemos de comentar que na última festa todos os nossos amigos tomaram bala para curtir mais a noite. 

Ao contrário do que defendemos compartilhando o post da cerveja artesanal do momento, bebemos mais e bebemos pior.

Entendemos que as BICICLETAS podem salvar o mundo da poluição e a nossa rotina do estresse. Mas vamos de carro ao trabalho porque sua, porque chove, porque sim. 

Vimos todos os vídeos que mostram que os fast-foods acabam com a nossa saúde – dizem até que tem minhoca na receita de uns. E mesmo assim lotamos as filas do drive-thru porque temos preguiça de ir até a esquina comprar pão. 

Somos a geração que tem preguiça até de tirar a margarina da geladeira.

Preferimos escrever no computador, mesmo com a letra que lembra a velha Olivetti, porque aqui é fácil de apagar. 

Somos uma geração que erra sem medo porque conta com a tecla apagar, com o botão excluir. Postar é tão fácil (e apagar também) que opinamos sobre tudo sem o peso de gastar papel, borracha, tinta ou credibilidade.

Somos aqueles que acham que empreender é simples, que todo mundo pode viver do que ama fazer. Acreditamos que o sucesso é fruto das ideias, não do suor. Somos craques em planejamento e medíocres em perder uma noite de sono trabalhando para realizar.

Acreditamos piamente na co-criação, no crowdfunding e no CouchSurfing. 

Sabemos que existe gente bem intencionada querendo nos ajudar a crescer no mundo todo, mas ignoramos os conselhos dos nossos pais, fechamos a janela do carro na cara do mendigo e nunca oferecemos o nosso sofá que compramos pela internet para os filhos dos nossos amigos pularem.

Nos dedicamos a escrever declarações de amor públicas para amigos no seu aniversário que nem lembraríamos não fosse o aviso da rede social. 

Não nos ligamos mais, não nos vemos mais, não nos abraçamos mais. 

Não conhecemos mais a casa um do outro, o colo um do outro, temos vergonha de chorar.

Somos a geração que se mostra feliz no Instagram e soma pageviews em sites sobre as frustrações e expectativas de não saber lidar com o tempo, de não ter certeza sobre nada. 

Somos aqueles que escondem os aplicativos de meditação numa pasta do celular porque o chefe quer mesmo é saber de produtividade.

Sou de uma geração cheia de ideais e de ideias que vai deixar para o mundo o plano perfeito de como ele deve funcionar. 

Mas não vai ter feito muita coisa porque estava com fome e não sabia como fazer arroz.



(Marina Melz, revista Pazes)






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07 janeiro 2017

Um espírita no Umbral



Um homem de 55 anos, espírita, sofreu um acidente e morreu de repente. Ele se viu saindo do corpo e chegando a um lugar escuro, feio, tétrico, com energias muito negativas.

Assim que começou a caminhar por aquele vale sombrio, viu três espíritos vestidos com capa preta caminhando em sua direção. Assim que chegaram, o homem perguntou:

– Que lugar é esse?

– Aqui é o que vocês espíritas chamam de umbral – disse um dos espíritos. 
O homem ficou chocado com aquela informação. 
Mal podia acreditar que estava no umbral. 
Considerou que talvez estivesse ali para participar de alguma atividade socorrista aos espíritos sofredores. 
O espírito negativo, que lia seus pensamentos, respondeu que não. Ele estava ali porque o umbral era a zona cósmica que mais guardava sintonia com suas energias.

– Mas isso é impossível!!! – disse o espírita em desespero. – Não posso estar no Umbral. Deve haver algum erro…
Em primeiro lugar eu sou espírita, faço parte dessa religião maravilhosa que é considerada o consolador prometido por Jesus.
Realizo também projetos sociais de doação de sopa aos pobres.
Ministro o passo magnético duas vezes por semana a uma multidão de pessoas lá no centro.
Também ajudo financeiramente instituições de caridade muito necessitadas, além de dar palestras no centro para os iniciantes no Espiritismo. Definitivamente há algo errado…

- Não há nenhum erro – disse o espírito das sombras – Em seu atual estágio de evolução, você tem que ficar aqui mesmo.
É verdade que você é espírita e faz parte desta doutrina consoladora, mas intimamente você julgava pessoas de outras religiões inferiores por não serem espíritas.
Sim, você realizava projetos sociais dando sopa aos pobres, mas em seus pensamentos sentia-se o máximo praticando a caridade e julgava que os pobres não eram tão evoluídos por estarem amargando a pobreza, quando na verdade muitos deles eram mais puros que você.
Sim, você ministrava o passe, mas considerava que seu passe era mais “poderoso” e mais curador do que o passe de outros passistas. Sim, você ajudava financeiramente instituições de caridade, mas dentro de ti sempre dava o dinheiro esperando receber algo em troca e sentindo-se alguém muito “caridoso”.
E finalmente… Sim, você dava palestras aos iniciantes na doutrina, mas acreditava ter mais conhecimento que eles e se colocava numa posição de destaque e vaidade intelectual.
Tudo isso suscitando uma das maiores chagas da humanidade, o “orgulho” e a “vaidade”.

O homem ficou impressionado com as revelações daquele espírito.
De fato, revendo suas atitudes e sua perspectiva, intimamente havia quase sempre um sentimento de superioridade, de orgulho em relação aos outros, diante de tudo o que foi feito.

O espírita então olhou para dentro de si e começou a se arrepender de tudo aquilo, reconhecendo seu erro e sentindo-se mais humilde.

Nesse momento, ele sentiu uma luz brilhando dentro dele e começou a se elevar.

Ao perceber que estava se elevando e deixando o umbral, avistou outros espíritos ainda presos à condição umbralina e novamente lhe veio um orgulho e uma sensação de superioridade em relação aos mesmos.

Após sentir isso, caiu novamente no umbral, e a queda dessa vez foi ainda mais dolorosa.

Um dos espíritos trevosos disse:

– Você caiu novamente porque, no momento em que se elevava, começou a sentir uma certa superioridade em relação aos espíritos que aqui estavam, suscitando mais uma vez uma condição de orgulho.
Além disso, “A quem muito foi dado, muito será exigido; e a quem muito foi confiado, muito mais será pedido.” (Lucas 12:48).

O homem ficou muito triste com tudo aquilo.

Entrou dentro de si mesmo e com toda a sinceridade pensou: Sim, é isso mesmo. Eu fui uma pessoa arrogante por ser espírita e por tudo o que eu fazia. Esse orgulho neutralizou todo o mérito de minhas ações.

Mas tudo bem, eu mereço estar aqui no umbral. 
Vou ficar por aqui mesmo, quem sabe eu aprendo alguma coisa. Não me importo mais comigo e entrego minha vida a Deus… Como disse Jesus, “Que seja feita a vontade de Deus e não a minha”.

O homem caiu no chão e apenas se entregou a Deus com fé. 
Nesse momento, não tinha mais nenhum sentimento de auto-importância.
Fechou os olhos e deixou tudo fluir…

Nesse momento, seu corpo começou a se tornar um corpo de luz e, sem nem perceber, começou a se elevar novamente.
Assim que chegou a uma zona mais elevada, abriu os olhos e, para sua surpresa, havia se libertado do umbral. Dessa vez, nem percebeu que estava se elevando e se libertando.

Um dos espíritos trevosos estava esperando por ele nesse plano mais elevado. Tirou a capa preta e uma luz maravilhosa começou a brilhar.
O espírita percebeu que esse espírito não era negativo, mas um espírito de luz que o estava ajudando desde o início.
O espírito disse:

– Tua renúncia de ti mesmo no último momento te salvou do umbral. Que tudo isso sirva de lição para você, meu filho. Toda essa experiência que você passou serve para os membros de qualquer religião. E não se esqueça jamais do que disse Jesus:

“Não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita.” (Mateus 6:3)



(Hugo Lapa)







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Transformação interior

                 
Jorge era um sujeito comum. 

Tinha um bom emprego, relacionava-se bem com os colegas e era um profissional exemplar.

Não menos dedicado à família, era um pai respeitado e marido compreensivo.

Claro que também cometia erros e tinha problemas, como todo ser humano.

Às vezes, também reclamava da vida. Como toda pessoa, tinha sonhos e desejos irrealizados. 

O problema é que, com o tempo, sem que se soubesse o porquê, essas reclamações se tornaram cada vez mais constantes. 

As menores dificuldades que surgiam o aborreciam profundamente, ao mesmo tempo em que o desânimo com o trabalho aumentava. 

Os conselhos o deixava irritado e os filhos já não lhe despertavam a ternura de antes. Só conseguia relaxar da tensão e da ansiedade do dia a dia na hora na cervejinha com os amigos.

Com o tempo, perdeu completamente o interesse pelo trabalho, chegando, mesmo, a odiar o emprego. 

O convívio com a família se tornava cada vez mais insuportável e sua válvula de escape era beber... cada vez mais.

A esposa, temendo a ruína total do lar, sugeriu que o marido procurasse orientação psicológica. 

Jorge, num lampejo de lucidez, aceita, mas não comparece a mais do que uma sessão. 

Cada vez mais ausente e apático, só encontrava forças para brigar, enfurecido, com a família, o que fazia com um certo prazer ao ver seus entes queridos magoados. Isso acabava gerando um complexo de culpa, o que o deixava preso ao círculo vicioso e doentio da depressão.

À noite, quase não dormia. 

Tinha pesadelos constantes, escutava passos e via vultos pela casa. 

Não admitia, mas no fundo começava a acreditar que estava enlouquecendo. 

É claro que seu corpo começou a manifestar doenças cada vez mais difíceis de serem diagnosticadas, devido à perturbação espiritual em que se encontrava.

Com a situação cada vez mais fora de controle e o casamento ameaçado, a família resolveu levá-lo, por indicação de terceiros, a um centro espírita. 

Jorge, surpreso com a ideia, parecia uma fera presa por correntes indefiníveis. 

Mal assiste a palestra. 

Irrita-se, debocha e, por fim, cochila, mas após os passes
energéticos sente-se mais calmo e sereno.

Na semana seguinte, quando retorna, após o trabalho de desobsessão, já começa a apresentar sinais de melhora. 

Afirma sentir-se mais leve... chega a sorrir e abraçar a esposa.

Passados dois anos, Jorge é outra pessoa. 

Iniciou, com sinceridade, a longa jornada do autoconhecimento e reforma íntima, vivendo com mais lucidez. 

Passou a frequentar o centro espírita que tanto o ajudou e, com o estudo da doutrina, se tornou palestrante e voluntário na casa, sendo um valioso médium nos trabalhos de desobsessão.

Este é um caso que se repete aos milhares, todos os dias. 

Precisamos entender que toda sintonia espiritual, seja com encarnados ou desencarnados, tem suas raízes na alma de cada um. 

Diante desta realidade, conhecermos o nosso mundo interior, mudando em nossas vidas aquilo que nossa consciência nos indica, é o começo do processo de equilíbrio. 

Nossos hábitos são moldados por aquilo que pensamos e sentimos, definindo, dessa forma, nossa companhia espiritual.

Transformemos nossa vida, começando por nós mesmos. 

O resto, é consequência.



(Escrito por Victor Rebelo)









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Milton Nascimento - Resposta ao tempo


Lindo...
Uma releitura de Resposta ao Tempo (tema de Hilda Furacão, na voz de Nana Caymmi)


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A claridade das palavras


De repente, um silêncio tão bem dito que não entendi mais nada. 

Ao contrário de outros, alguns silêncios apagam a luz.

Bendita seja a claridade das palavras também quando permitem que dúvidas sejam dissolvidas. Que equívocos não sejam alimentados. Que distâncias não cresçam. Que a confiança prevaleça. Que o afeto não se torne encabulado.

Bendita seja a claridade das palavras também quando ficamos no escuro da incompreensão, tateando as paredes deste cômodo pouco ventilado à procura de um interruptor qualquer que acenda o nosso entendimento.

Bendita seja a claridade das palavras também quando aproximam, em vez de afastar. Quando nos possibilitam o conforto da verdade, mesmo que ela desconforte. Quando simplesmente queremos saber o que está acontecendo com as pessoas que amamos simplesmente porque amamos.

Bendita seja a claridade das palavras quando ditas com o coração. Ele sabe como acender a luz.


(Ana Jácomo)




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05 janeiro 2017




Eu jamais chegaria onde cheguei se só andasse em linha reta.
Tive que voltar atrás, andar em círculos, perder dias, perder o rumo, perder a paciência e me exaurir em tentativas aparentemente inúteis para encontrar um quase endereço, uma provável ponte: a entrada do encontro.
Acertei o caminho não porque segui as setas, mas porque desrespeitei todas as placas de aviso...

(Marla de Queiroz)




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Tomara



Tomara que os olhos de inverno das circunstâncias mais doídas não sejam capazes de encobrir por muito tempo os nossos olhos de sol.

Que toda vez que o nosso coração se resfriar à beça, e a respiração se fizer áspera demais, a gente possa descobrir maneiras para cuidar dele com o carinho todo que ele merece.

Que lá no fundo mais fundo do mais fundo abismo nos reste sempre uma brecha qualquer, ínfima, tímida, para ver também um bocadinho de céu.

Tomara que os nossos enganos mais devastadores não nos roubem o entusiasmo para semear de novo.

Que a lembrança dos pés feridos quando, valentes, descalçamos os sentimentos, não nos tire a coragem de sentir confiança.

Que sempre que doer muito, os cansaços da gente encontrem um lugar de paz para descansar na varanda mais calma da nossa mente.

Que o medo exista, porque ele existe, mas que não tenha tamanho para ceifar o nosso amor.

Tomara que a gente não desista de ser quem é por nada nem ninguém deste mundo.

Que a gente reconheça o poder do outro sem esquecer do nosso.

Que as mentiras alheias não confundam as nossas verdades, mesmo que as mentiras e as verdades sejam impermanentes.

Que friagem nenhuma seja capaz de encabular o nosso calor mais bonito.

Que, mesmo quando estivermos doendo, não percamos de vista nem de sonho a ideia da alegria.

Tomara que apesar dos apesares todos, dos pesares todos, a gente continue tendo valentia suficiente para não abrir mão de se sentir feliz.

Tomara.




(Ana Jácomo)




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"No amanhã moram milhares de possibilidades, e eu não digo 'nunca' para nenhuma delas. Eu escolho alguns caminhos, evito outros. Mas que seja leve. Que seja doce. E que eu tenha fé."

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Hoje é dia de renovar meus compromissos assumidos, do outro lado, na espiritualidade; e agradecer a todos os que vieram comigo ou que estiveram nessa vida, para dar o amparo necessário para que cumprisse minha humilde missão.

Mesmo quando não entendemos os planos superiores, Ele entende.


Gratidão sempre!


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