03 outubro 2011

A médium que batia no marido (crônica)


Rosicléia apresentou os primeiros sinais do desenvolvimento da sua mediunidade após três anos de casada com Everton.

A primeira vez que ela reparou algo diferente foi quando o marido saiu do banho e como de costume, largou a toalha molhada em cima da cama. Rosicléia sentiu um fogo subindo pelo corpo, o coração acelerou e uma voz gritou em seus pensamentos: - Ele pensa que eu sou sua escrava!

Rosicléia estava com muita raiva e inebriada por essas emoções foi para a cozinha fazer o jantar. Enquanto cozinhava, lutava para parar de remoer os pensamentos que a atormentavam.

O casal sentou-se para fazer a refeição juntos e assim que Everton colocou a primeira garfada de comida na boca, disse nostálgico para a esposa: - O picadinho da minha mãe é famoso. Da próxima vez que encontrarmos com ela, vou pedir para ela te dar a receita!

Rosicléia ficou descontrolada! Aquela foi a gota d´água e os pensamentos estavam como pipoca estourando na panela: - Como pode dizer que meu picadinho é ruim?

A raiva era tamanha que Rosicléia foi chorando para o quarto e Everton entendeu que ela deveria estar em um "daqueles dias".

O problema é que as coisas não melhoravam, a mãe de Rosicléia aconselhou a filha dizendo que era natural isso acontecer com todos os casais depois de um tempo.

Mas Rosicléia não conseguia entender como era possível estar incomodada com coisas que antes ela não se importava. O futebol na hora da novela, a tampa aberta no banheiro, o esquecimento da data do aniversário, o papo machista com os amigos no bar, a falta de atenção com as coisas importantes...

Mas ela pensava: - Casamento é assim mesmo, eu que estou tendo pensamentos intrusos, pensamentos que não são meus.

Jucelina, a vizinha de Rosicléia depois de saber do problema da amiga a levou até o Centro que ela frequentava.

No atendimento fraterno foi explicado para Rosicléia: isso é mediunidade, você precisa estudar e trabalhar. Everton ao saber do problema da esposa, resolveu também frequentar o Centro espírita para apoiá-la.

Rosicléia estudou bastante, mas não conseguia sentir nenhuma melhora. Ao contrário, agora a vontade de ¨voar no pescoço" do marido era por vezes, incontrolável. Ela mesma chegou a conclusão que se tratava de uma obsessão complexa.

Everton e Rosicléia foram convidados pelos companheiros que estavam acompanhando o problema do casal, a participar de uma reunião para desenvolvimento mediúnico.

Logo nas primeiras reuniões, depois da observação de uma médium que mencionou ter percebido uma entidade próxima de Rosicléia, aconteceu a primeira manifestação psicofônica. Algumas palavras de raiva foram manifestadas, acompanhadas de socos e tapas contra Everton que amparava a esposa.

Toda semana era assim, Rosicléia saia da reunião aliviada e Everton repleto de hematomas.

Os dirigentes resolveram permitir a situação, uma vez que Rosicléia passou a desmaiar na rua, passar noites atormentada, chorava descontroladamente e já não conseguia mais se concentrar em suas atividades diárias.

A mediunidade de Rosicléia podia ser melhor definida como “socofônica”, contra o marido é claro.

Os protestos logo chegaram, isso não podia mais ser permitido na reunião mediúnica.

Principalmente depois que uma médium experiente disse não ter visto nenhuma entidade no momento da “socofonia”.

- Será que é animismo? - pensou Rosicléia de maneira assustada.

Um sábio preto-velho que seria melhor recebido na reunião, se viesse de médico alemão, manifestou com simplicidade sua orientação para ela:

- Fia, se toda muié que tivé vontade de batê no marido trapaiado, colocá a culpa na mediunidade, os obsessor e os guia vão ficá sem emprego! Ao invés da fia caçá obsessor desencarnado, acerta os pontero com o obsessor do marido. Bendita oportunidade da reencarnação!

E assim nunca mais Everton apanhou de Rosicléia e também foi o fim das toalhas molhadas em cima da cama.






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