23 outubro 2011

Perguntas e respostas frequentes sobre o Luto




No caso de pais que perderam filhos:

1) Como lidar com o luto?

Poder expressar livremente seus sentimentos em relação a morte daquele filho e buscar dentro de si o que ainda dá sentido a sua vida, de maneira a se reconstruir, se resignificar, é a melhor maneira de lidar com o luto.

2) A dor de perder um filho é para sempre?

Sim, mas a intensidade da dor, a característica do sofrimento, deve mudar.

Sempre faço analogia a uma ferida que no início sangra, arde, dói de maneira quase insuportável e depois, no seu tempo, vai fechando, deixando uma cicatriz. Essa cicatriz estará lá para sempre, enorme, visível ao olhos, mas não sangra como de início.

3) Creio que é normal os pais se revoltarem ainda mais por ser algo contra a natureza. Como e de que forma consolar estes pais? 4) E o que não se deve dizer para não agravar ainda mais a dor destes pais (exemplo: é comum as pessoas falarem)?

A revolta é normal e faz parte das fases do luto. A palavra não é consolo. Nada consola.

O que se deve fazer é oferecer acolhimento e apoio: o apoio que esses pais precisam – eles devem dizer quando e como querem ser ajudados – e manter os braços abertos para que eles manifestem qualquer tipo de sofrimento, sem conselhos, criticas ou cobranças.

“Seja forte” e “não chore, seu filho não ia querer te ver triste” ou “O tempo cura tudo”, “Confio na sua força”, por exemplo, são frases que podem atrapalhar muito.

5) O que fazer com o quarto e pertences do filho (desmanchar tudo fará a dor diminuir mais depressa)?

Não, desmanchar tudo não fará a dor diminuir mais depressa.

Quem deve decidir quando e como desmanchar o quarto e doar os pertences daquele filho são os seus pais.

Ninguém pode saber o que é melhor ou pior para eles. Não há regra. 

O aconselhamento nesses casos é que esses pais conversem muito até que concluam, juntos, o que e quando o farão.

Se há dúvida, deve-se esperar até o momento certo. Não há problemas se o casal precisa que o quarto “fique como estava” por um tempo, que, geralmente, não passa de 3 a 6 meses.

6) O que fazer nas datas comemorativas?

Rituais são extremamente importantes, principalmente nas datas comemorativas. Podem ser religiosos ou não. Mas devem fazer sentido para esse pai, essa mãe.

Tenho uma paciente que durante o primeiro ano colocava um lindo arranjo de rosas para a filha, no quarto que era da filha, sobre a cama, nas datas comemorativas. Isso era como ELA ritualizava, como se sentia bem.

Na terapia, costumo ajudar na busca de um ritual que faça sentido para aquele paciente e que pode mudar com o tempo.

7) Quanto tempo leva para que as coisas voltem ao “normal”?

As coisas nunca voltarão ao normal, se você chama de normal ser tudo igual como era antes.

Se você chama por normal a rotina, isso depende muito de cada um, mas geralmente em 6 meses os pais enlutados já começam a encontrar mais “normalidade” no dia-a-dia.

8) Quando é hora de procurar ajuda?

A qualquer tempo.

Acredito, particularmente, que a terapia do luto se iniciada logo após a morte, tem muitos benefícios, não pela “terapia” em si, mas pelo aconselhamento.

Nossa sociedade não tem a morte num lugar de naturalidade e não esta “preparada” para esses momentos, tomando atitudes muitas vezes bastante comprometedoras para o desenvolvimento do luto.

9) Como é aplicada a terapia nestes casos?

O formato inicial, na maioria das vezes, é de aconselhamento. 

Coisas muito práticas como ver ou não ver o filho morto, ir ou não ir ao velório, levar ou não os irmãos pequenos ao velório, falar ou não a verdade.

Para essas perguntas temos conselhos práticos, baseados em evidencias clinicas e pesquisas cientificas, do que pode ser melhor ou pior, para a maioria das pessoas, mas cada caso é um caso.

A terapia do luto é a expressão livre dos pensamentos e sentimentos a respeito da morte.

Poder expressar livremente seus sentimentos em relação a morte é essencial no processo de reaprendizado, de resignificação da própria vida sem aquela pessoa querida.

A terapia do luto consiste nesse reaprendizado, descobrindo e reconhecendo a maneira particular daquela pessoa viver seu luto e encontrar suas próprias ferramentas para aliviar sua dor.

10) Como agir com o outro filho que está vivo (alguns pais tendem a proteger demais o filho que continua vivo e às vezes, sem querer, chegam a compará-lo com o que morreu)?

Isso é comum e no início, muitas vezes inevitável.

No decorrer da terapia, se identifico que a criança que ficou continua sendo sobrecarregada ou sofrendo comparações, trabalho com os pais e muitas vezes, convido a família para um encontro de família – uma sessão onde as crianças e os pais vêm juntos.

A partir daí, temos material para conduzir o caso de maneira mais precisa, pontuando e ajudando aqueles pais a entenderem o que está se passando e como isso pode ser sofrido para a criança que ficou.

11) É verdade que é comum os pais se separarem após a morte de um filho? A que se deve isso?

Sim, é verdade. O índice de separação é alto no primeiro ano apos a perda de um filho. Isso se deve, muitas vezes, ao fato de que cada um “sente a morte” e se enluta, da sua maneira, o que é normal e estimulado até.

A questão é quando as reações e maneiras de viver o luto são muito diferentes e um quer que o outro faça o que é bom para si, gerando conflitos e um grande afastamento entre o casal.

Quando existem pendências anteriores, culpas, etc ou o casal estava em crise antes da morte, isso pode configurar um risco maior de afastamento desse casal durante o luto.

Sempre que possível, no primeiro encontro com pais que perderam filhos explico sobre a necessidade de cuidado com “a entidade casal”, oferecendo a eles ferramentas para lidarem com suas diferenças na maneira de reagir diante da morte e da perda de seu filho, garantindo-lhes que não há certo e errado, não há regras exatas a serem seguidas.

Eles tem sim, que aprender a respeitar o desejo do outro e conversar muito, muito mesmo, sobre tudo o que pensam e sentem sobre a morte de seu filho.

Na terapia do luto, procura-se enfatizar que o sofrimento é único e que ninguém sofrerá exatamente da mesma maneira.

Cada um tem seu ritmo, reage de forma diferente e não existe certo e errado.

Não existem regras a serem seguidas para se lidar melhor com a morte. Existe sim, uma descoberta do processo único de cada um em manifestar e reagir a sua dor e encontrar o que a alivia.


(Adriana Thomaz, em entrevista para Lia Kehr)









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