11 dezembro 2012

O Ateu



Minha mensagem é destinada aos homens de pouca fé.

A eles eu peço uma atenção especial.

Quando caminhei pelo mundo terreno, desconhecia que a vida se prolongava após a morte física. Duvidava desta realidade e, por isso, combatia as idéias religiosas com pertinácia.

Os sermões dos padres, pregações evangélicas ou qualquer tipo de conversação espiritualista eu sempre ignorava com desprezo, ou, quando havia chance, emitia opinião desfavorável. Eu repudiava todo e qualquer pensamento que assumisse um cunho religioso.

Era um ateu convicto e não atinava que minhas concepções, na verdade, eram preconceitos construídos com base na vaidade pessoal.

Às portas da morte, busquei um consolo na filosofia materialista que eu professava, porém este não veio.

Na realidade, eu nunca havia pensado no futuro, pois no futuro em que eu acreditava, haveria apenas o vazio. Eu tinha sede de viver, continuar pensando, manter minha consciência, mas eu não acreditava na alma imortal.

Então, a angústia tornou-se companheira inseparável dos meus últimos dias. Meus amigos e parentes mais chegados não conseguiram abrandar os sentimentos deprimentes que se apossavam de mim.

Quando meus olhos fecharam-se para a vida material, passei a andar às cegas por estranhos caminhos.

Eles não tinham início, meio ou fim definidos. Pareciam formar um labirinto, que espelhava o que se passava em minha alma. Afinal de contas, não cultivei sentimentos elevados ou solidários durante a vida física, e os poucos amigos que tinha eram da mesma estirpe que eu, ou seja, alimentavam idéias semelhantes às minhas.

Não compreendia a minha situação, já que apenas lembrava-me de que estava desenganado pelos médicos, prostrado no leito.

Por quê caminhava a esmo? O que havia ocorrido? Haveria perdido a razão? Estaria moribundo em meio a alucinações de morte?

Eu não poderia mesmo entender, pois assumi como verdade incontestável que após a morte reinaria o nada.

Lembrei-me dos remédios ministrados e concluí que eles deveriam estar causando tanta confusão mental. O câncer corroía-me, mas os médicos receitavam com freqüência no afã de tirarem-me os niqueis.

Para eles, a medicina era apenas um modo de sobreviver. Se era para eu permanecer naquele estado, que deixassem-me morrer! Infelizes homens de branco sem ética, que pouco se diferenciavam de banqueiros ávidos por lucro!

E com este estado de espírito, caminhei por muitos anos por veredas escuras.

Depois soube que foram quase trinta anos. Havia perdido por completo a noção de tempo. Não poderia imaginar que tinha vagado por quase três décadas.

Neste período, minha sina era ser um andarilho que passava fome e sede, sofrendo dores constantes, que eram reflexo da doença que destruiu meu corpo. Às vezes parava por imposição do cansaço e caía num sono perturbador e longo. Em seguida, levantava para voltar a caminhar sem rumo.

Em determinado dia, de suma importância para meu espírito, cheguei a um local que tinha luminosidade própria. Era um ponto de luz que se destacava naquela escuridão.

Finalmente pude enxergar algo mais definidamente, embora, conforme me aproximasse, a claridade incomodasse meus olhos. Estaquei somente quando cheguei diante de um grande portão.

Este era ladeado por torres de vigia bastante elevadas. Pude ver guardas por trás do portão e pedi ajuda. Minha fraca voz parecia não surtir efeito, mas, após algum tempo, vieram me atender.

Recolheram-me para dentro daquele local e rapidamente tornaram a fechar a entrada. Confuso e cansado, desfaleci.

Pela primeira vez em muito tempo, tive um longo sono reparador. Durante este descanso, revi toda a minha vida material. Recordei as oportunidades, decepções, algumas fugazes alegrias e tudo o mais que serviu para que eu fizesse uma avaliação daquela experiência terrena.

Quando despertei, fui carinhosamente alertado para o fato de que já não dispunha de corpo carnal. Em princípio fiquei arredio com a notícia, pois ela era contrária aos conceitos que cultivava desde longa data. Porém, como eu era um homem de raciocínio lógico e havia notado um encadeamento coerente entre os fatos que ocorreram, acabei aceitando a nova realidade.

Entendi que temos uma alma imortal e que Deus está acima da vida e da morte. Deus é uma inteligência superior que age em conformidade com um amor infinito, apesar de nós seres humanos sermos tão orgulhosos.

Nos dias que vão, preparo-me para reencarnar, pois esta é uma lei da qual não podemos fugir, porque através do seu funcionamento nós evoluímos.

Ainda faço planos timidamente, mas uma coisa é certa: tenciono nascer num meio em que me ensinem, desde os primeiros anos, o ABC do espiritualismo. Assim, espero não mais me enredar nas malhas frias e duras da incredulidade.


(“O ateu”, in “Depoimentos do Além”, do médium Pablo de Salamanca /Espíritos diversos)
 

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