Quantos assassinei?
Quantas vidas interrompi?
Pelas minhas mãos,
nenhuma. Sob minhas ordens, talvez alguns milhões.
Falta-me ar. Mal posso
respirar desde que aqui cheguei.
Sim, sim, sou um
monstro. Ouço isto minuto após minuto, dia após dia. Sou culpado,
sinto-me culpado.
Em vida acreditei
piamente estar fazendo um favor à humanidade, melhorando a raça
humana no planeta, livrando-a de seres inferiores.
Deixei-me levar por
idéias, que hoje reconheço insanas. Idéias de um lunático a quem
não posso culpar porque afinal eu as aceitei e as segui.
No início, promoções,
uma bela carreira, uma vida de luxo e glória.
Com a queda do Reich,
a fuga, os anos de exílio longe da pátria, em meio de gente tão
inferior e desprezível que eu mal podia aceitá-los como seres
humanos.
Localizado e capturado
por aqueles que eu tanto odiava, fui julgado e condenado à forca.
Desencarnei com a corda
apertando meu pescoço, sob os olhares de centenas de judeus,
pensando que iria para a Glória.
Ao abrir os olhos do
espírito, vi que as centenas de encarnados estavam acompanhados de
milhares de desencarnados, de horrendo aspecto.
Com o mesmo ódio em
que os tratei em vida fui tratado.
Arrastado aos umbrais
sofri todo tipo de tortura e humilhação.
Desde meu enforcamento
em 1962, fui prisioneiro do ódio e do rancor daqueles que mandei
executar, destruindo seus lares, suas famílias e suas vidas.
Nunca tive Deus no
coração. Isto nunca fez parte da minha cultura.
Mesmo assim, o
sofrimento atroz me fez, mesmo que num lampejo, renegar meu passado e
pensar Nele.
Resgataram-me.
Tiraram-me da catacumba fria e sombria onde sobrevivia aos maus
tratos de meus algozes.
Fui levado a um posto
de socorro, onde tratam-me com dignidade e bondade.
Tempos depois vim a
compreender que o posto de socorro localiza-se sobre o espaço de
Israel, e que praticamente todos que ali humildemente servem foram
judeus quando encarnados.
É desconcertante ser
tão bem tratado pelo povo a quem tanto ódio nutri durante minha
última existência.
Fazem apenas alguns
meses que fui socorrido, e começo a entender a extensão de meus
erros.
Fui informado que
talvez não me seja permitido reencarnar na Terra e que terei que
buscar o aprendizado redentor num mundo mais denso e atrasado. Tudo,
porém, dependerá de meus progressos.
Tenho ainda uma
aparência horrível, mãos deformadas, olhos esbugalhados
resultantes do enforcamento, dores no pescoço, falta de ar.
Pesadelos ainda me
perseguem.
Peço diariamente
perdão a Deus e aos que feri.
Infelizmente e por meu
merecimento, muitos ainda não me perdoaram. Mas eles haverão de
fazê-lo, assim como Deus já o fez.
Esperarei este dia com
humildade e paciência.
Adolf Eichmann*
(psicografado por
Cleber P. Campos)
* Adolf Otto
Eichmann foi um político da Alemanha Nazista e tenente-coronel da
SS. Foi responsabilizado pela logística de extermínio de milhões
de pessoas no final da Segunda Guerra Mundial.
* * *
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