08 novembro 2014

O outro lado


O que há do “outro lado”?

Esta não é uma pergunta feita apenas por historiadores. E, sim, pela sociedade.

Religiosos, filósofos, antropólogos, médicos, pesquisadores de várias áreas, além de cidadãos comuns, querem saber.

Passa-se por um túnel frio e escuro para mergulhar em águas quentes e iluminadas?

Voa-se, de forma invisível, sobre o próprio corpo?

Seres de luz vêm nos buscar?

Nada se sabe, embora se acumulem depoimentos daqueles que voltaram do além.

Mesmo com o cérebro aparentemente estacionário, eles foram capazes de ter visões.

Os cientistas chamam o fenômeno de EQM: experiência de quase-morte ou neardeath experience, termo cunhado pelo psiquiatra norte-americano Raymond Moody depois de ter estudado mais de cem casos.

Atualmente, sociedades científicas com publicações reconhecidas internacionalmente se debruçam sobre o tema.

Desde sempre se tentou estabelecer um conhecimento sobre o silêncio absoluto que separa o ser e o não ser, o conhecido e o desconhecido, o aqui e o lá, a presença e a não presença, o saber e a ignorância.

Nossos antepassados acreditavam na ação dos mortos sobre vivos.

Não se tratava de uma “crença” como anacronicamente estamos acostumados a pensar, mas de uma verdade.

Hoje, sabemos – mais ou menos – que nossos mortos não vão voltar, não terão nada a nos dizer e que não podemos lhes pedir afeição, proteção ou conselho.

Nosso luto não é mais encantado. Não era assim, outrora.

Outrora, o morto continuava vivo no seu túmulo.

Recebia as homenagens dos descendentes, imóvel, mas consciente.

A sepultura seria apenas outra residência, cela de dormitório, onde aguardaria o despertar no Dia do Juízo e que, por vezes, deixaria para proteger ou informar os vivos, comunicando-se com eles em sonho ou por algum sinal exterior.

Sim, o “outro lado” era logo ali.

Desde sempre os mortos foram invocados para cuidar dos vivos.

São eles que nos acenam, vem soprar informações e trazer recados do além.

Muitos de nós queremos ouvi-los, vê-los, deixar-se abraçar e por que não, levar…

Porém, mais importante do que respostas sobre o que haveria do “outro lado”, era a vontade de acreditar.

Acreditar que exista outra vida, melhor, mais tranquila.

Onde tudo será paz e serenidade.

E essa vontade, a de crer, persiste.

A morte e os mortos vem sendo objeto do maior interesse nas sociedades contemporâneas.

“Morrer, modo de usar”, será em breve uma discussão com várias pautas: eutanásia, morte assistida, morte digna,
com liberdade de escolher.

E ela vai levar, como num círculo eterno, à mesma pergunta: onde vamos? Se é que vamos.

Além dos mortos, os informantes são aqueles que podem predizer.

Predizer é uma dimensão fundamental da vida dos homens.

Todos temos um pé no presente e outro no futuro.

Viver é antecipar sem cessar, pois nossas ações miram um objetivo lá na frente.

Mas, apenas uma parte desse futuro é conhecida.

Aquela que nos informa que os dias têm 24 horas, que as estações vão se suceder e a as fases da Lua, também.

Mas, e o resto?

Do quê será feito o amanhã?

Para sermos eficientes, estarmos à altura dos desafios e tomar as boas decisões precisamos, pois, antecipar.

Recorremos a quem pode nos anunciar o futuro: cartomantes, astrólogos, videntes. 

Para colocar um fim às incertezas, mas, também, para nos assegurar que não somos um joguete nas mãos do acaso.

E, sim, de um plano coerente.

Da Antiguidade aos nossos dias, desejamos antecipar para garantir o máximo de segurança.

E a previsão tem em si um poder mágico de autorrealização.

Convencer-se de uma vitória ou de uma derrota, é a melhor maneira de suscitar sua concretização.

O importante ao receber uma mensagem vinda “do outro lado” não é tanto a exatidão da informação, mas seu papel de terapia social ou individual.

O que importa não é que a previsão se realize, mas alivie, cure ou convide a agir.

Astrólogos, cartomantes, médiuns e videntes agem como médicos da alma.

Não é surpresa que, em épocas como a nossa, quando a vida é geradora de angústias, seus endereços se multipliquem.

Mas a mensagem “do outro lado” jamais é neutra.

Ela corresponde sempre a uma intenção ou a um medo.

Ela exprime um contexto e um estado de espírito.

Ela não nos ilumina sobre o futuro, mas reflete o presente.

Ela é reveladora das mentalidades de uma época, de uma cultura e de uma sociedade.

Excelente razão para conhecer sua história.


(in "Do outro lado – a história do sobrenatural e do espiritismo", de Mary Del Priore)





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