Senhor,
Neste mar indeciso e muitas vezes encapelado em que estou
perdida, dá-me alguma certeza de que existe uma rota firme e fixa, de que o
trajeto correto é possível e de que no fim desse nevoeiro me espera uma luz
positiva, uma luz boa, não apenas promessas e palavras vãs, mas realidades
necessárias para que eu sobreviva com minha preciosa carga humana, moral e
material de tantos bens que vêm sendo
mal cuidados.
Dá-me, Senhor, uma tripulação competente, com alta perícia,
que me tire destas dificuldades e
aflições, e me faça retornar ao que devo ser: um barco singrando águas
promissoras, com possibilidade de sucesso.
Crescimento, bem-estar e felicidade para os milhões de passageiros que confiam em mim, e pelos quais sou responsável.
Crescimento, bem-estar e felicidade para os milhões de passageiros que confiam em mim, e pelos quais sou responsável.
Pois, no nevoeiro, e com tantas nuvens de tempestade ameaçando,
talvez rochedos fatais debaixo da linha d´água, tenho medo de soçobrar.
Dá-me, Senhor, um timoneiro experiente, sério honrado, de
pulso firme e idéias claras, coerente, decidido, que saiba o que faz e que
deseje fazer o que é preciso para corrigir os rumos, a fim de que esta viagem
acabe bem, sem ligar para interesses diversos fora dessa sua missão única:
salva a nau, os passageiros, os bens aqui embarcados, e abrindo possibilidade
de muitas boas viagens por este mesmo mar.
Dá-me, Senhor, responsáveis que escolham sua tripulação
segundo seus merecimentos e preparo, gente boa, corajosa, incansável, que
consiga limpar as águas apodrecidas em que de momento estou mergulhada.
São
sujeiras de alguns anos, às quais tanto nos acostumamos que a idéia de
despoluir este oceano chega a espantar, como se isso não fosse possível, e
devêssemos todos, meus passageiros e eu, nos acomodar à idéia de que é assim
mesmo, de que a podridão é normal e o resto são utopias antiquadas
Dá-me, Senhor, águas limpas para navegar , pois nestas em
que navego bóiam algas, sujeira e até cadáveres que se prendem na minha quilha
ou impedem a hélice de funcionar: flutuo devagar, inclinada, num mar morto, à
beira de um naufrágio.
Não adianta mentir, nem inventar que estou bem, pois estou
naufragando em águas turvas com milhares e milhões de passageiros em meu bojo,
a grande maioria dos quais não faz a idéia do que realmente acontece.
Meus madeirames
estalam e tremem, mesmo assim há quem diga que estou em boas condições,
que os malefícios são mentiras, que tudo está controlado.
Contra a mentira e a mediocridade generalizadas, e a
resignação de tantos de meus passageiros, iludidos ou desinteressados, preciso de tua ajuda.
Dá-me, Senhor, gente que acredite que vale a pena mudar, que
incômodos, aborrecimentos, e até receios que quaisquer transformações impõem,
são essenciais e benfazejos nestas horas, que graves revelações precisam ser
seguidas de graves punições, sem as quais nada vai mudar, e continuarei sendo
uma nau incerta e ameaçada, enquanto outras muitas seguem em viagens
bem-sucedidas, crescendo em importância e benefícios para sua gente, integradas
na frota global onde tantos escapam de tempestades e recuperam seus eventuais
perdidos roteiros.
Minha esperança, Senhor, é que com tua ajuda eu receba apoio
e parceiros na busca da verdade, da honradez, da mudança firme, radical, talvez
dolorosa, que me livre de ideologias funestas e arcaicas, por meio de um
inaudito e necessário esforço pelo bem geral.
Que acabem as maquinações ocultas ou ameaças ruidosas do
perverso desejo do poder pelo poder, e da manutenção do poder espezinhando a
democracia, única salvação de qualquer povo.
E assim, quem sabe, numa difícil e audaciosa empreitada, a
gente escape dos redemoinhos fatais e volte a se equilibrar, redescubra as
melhores rotas e, com motores liberados de ônus perniciosos, velas abertas a
ventos limpos e benéficos, eu retome minha imagem positiva, e talvez me salve,
com meus passageiros, da ruína final.
Dá-nos, Senhor, dádiva da renovação pra que eu seja uma nau
respeitada e bela, e não restos de
naufrágio em qualquer ilha esquecida.
(Lya Luft)
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