É preciso deixá-los falar, pois, do contrário, não poderemos ajudá-los.
É necessário conhecer a sua história, suas motivações e sua razões.
(...) Não esperemos, jamais, uma expressão inicial sensata e equilibrada, amorosa e tranqüila, da parte daqueles que se acham desarmonizados.
Se assim fosse, não precisariam de nós: já teriam encontrado seus próprios caminhos. Esperemos, isto sim, uma eloqüente manifestação de revolta, rancor, desespero, aflição, desencanto, ou perplexidade, segundo a natureza dos problemas que os abrasam.
(...) O longo trato com eles, nos ensina que têm o hábito de “pensar alto”. Isto se deve a um mecanismo psicológico irresistível, do qual muitas vezes eles nem tomam conhecimento, e no qual, mesmo os mais hábeis e ardilosos deixam-se envolver.
É que o médium lhes capta o pensamento, e não a palavra falada.
Se o médium se limitasse a transmitir-lhes a palavra, mesmo assim, eles acabariam por revelar as suas verdadeiras posições, embora pudessem sonegar a verdade por maior espaço de tempo, mas é do próprio dispositivo mediúnico converter em palavras e gestos, aquilo que o Espírito elabora na sua mente.
Eles não conseguirão por muito tempo, ocultar as verdadeiras causas da sua dor e a razão da sua presença, pois é isso, precisamente, que os traz a nós.
(...) Insistimos, pois em afirmar que o médium traduz em palavras o que ele sente no Espírito manifestante: suas emoções, seu temperamento, seus problemas, suas desarmonias, ao mesmo tempo em que lhe reproduz os gestos, e a voz alteia-se ou sussurra, reflete ódio ou desprezo, ironia ou amargor, perplexidade ou aflição.
Se assim não fosse, teríamos que falar com cada Espírito na sua própria língua, ou seja, na língua que ele falou por último, na sua mais recente encarnação, e todo médium precisaria ser xenoglóssico.
(...) Pouco a pouco, o diálogo vai se desenvolvendo, a partir de uma espécie de monólogo, pois, no princípio, como vimos, é necessário deixar o Espírito falar, para que informe sobre si mesmo, o que acaba acontecendo.
Muitos o fazem logo de início, dizendo prontamente a que vieram e o que pretendem.
Mesmo a estes, porém, é preciso deixar falar, a fim de nos aproximarmos do âmago de seus problemas.
Outros são bem mais artificiosos. Usam da ironia, fogem às perguntas, respondendo-nos com outras perguntas ou com sutis evasivas, que nada dizem. (...)
Deixemo-lo falar, mas não tudo quanto queira, senão ficará andando em círculo, à volta de sua idéia central.
Neste caso, continuará a repetir incessantemente a mesma cantilena trágica: a vingança, o ódio, a impossibilidade do perdão, o desejo de fazer a vítima arrastar-se no chão, como um louco varrido, e coisas semelhantes.
O doutrinador precisa ter bastante habilidade para mudar o rumo de seu pensamento.
Terá que fazê-lo, não obstante, com muita sutileza, arriscando, aqui e ali, uma pergunta mais pessoal, falando-lhe de uma passagem evangélica que se aplique particularmente ao seu caso.
(...) No entanto, é preciso ajudá-lo a quebrar o terrível círculo vicioso em que se debate. Veja bem: ajudá-lo a quebrar, não quebrar, arrancá-lo à força. Ele tem que sair com seu próprio esforço.
Por outro lado, a fixação é, às vezes, tão pronunciada e tão absorvente, que o Espírito não tem condições sequer de ouvir o doutrinador, ou pelo menos, não reage de maneira inteligível ao que este lhe diz.
Isto não significa que o doutrinador deve calar-se; continue a falar-lhe, que as palavras irão insensivelmente se depositando nele, e mesmo que ele pareça não ouvir – e isso ocorre mesmo em certos casos – seu próprio Espírito sente as vibrações fraternas que sustentam as palavras.
Se é que o doutrinador realmente sente o que fala, ou melhor ainda, fala o que de fato sente.
Aguarde-se, pois, o momento de ajudá-lo a sair um pouco de si mesmo.
Tem que haver na sua memória outras lembranças, outros sentimentos e até mesmo outras angústias, além daquela que constitui o núcleo da sua problemática.
Coloque, de vez em quando, uma pergunta diferente, procurando atraí-lo para outras áreas da sua memória. Como por exemplo: teve filhos? Que fazia para viver? Crê em Deus? Onde viveu? Quando aconteceu o drama? Tem notícias de amigos e parentes daquela época?
É claro, porém, que essas perguntas não devem ser desfechadas numa espécie de bombardeio ou de interrogatório.
Ninguém gosta de submeter-se a devassas íntimas.
Com freqüência, os manifestantes reagem perguntando se estão sendo forçados a processos inquisitoriais. Ou, simplesmente, se recusam a responder. Ou dão respostas evasivas. Ou...respondem.
(Rubens Santini de Oliveira)
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