Como falar da morte com as crianças?
Trata-se, sem dúvida,
de um assunto delicado, mas que pode ser trabalhado de maneira muito didática
por meio da literatura infantil.
A autora propõe a utilização desse recurso
como instrumento auxiliar para uma abordagem mais branda da vida e da morte,
buscando o acalanto necessário no acolhimento às dores e aos sofrimentos
humanos.
Fruto da tese de doutorado defendida no Instituto de Psicologia da
Universidade de São Paulo (USP), a obra é também um ótimo material de apoio
para profissionais das áreas da saúde e da educação, assim como para os demais
interessados no tema.
*
Abaixo um pequeno trecho do livro:
Atualmente, a morte é colocada do lado de fora da vida,
entretanto, ela está muito próxima.
Basta nos depararmos com a violência que encontramos nas metrópoles,
envolvendo assaltos,
sequestros, acidentes e o anonimato.
Observamos também o medo aterrorizador das guerras e dos
ataques terroristas em outros países divulgados diariamente pelos meios de comunicação.
Se olharmos com atenção a questão da saúde, notaremos
mudanças que ocorreram com os avanços da Medicina.
Hoje, os idosos têm uma sobrevida maior; os pacientes
acometidos por algum tipo de doença crônica, como o câncer, por exemplo, têm uma chance de cura
e/ou de viver por mais tempo.
Além disso, indivíduos soropositivos para o HIV , que antes
eram vistos como condenados, hoje passam a ter uma vida muito mais próxima do normal, por
um tempo considerável, inclusive com chances de constituir família.
Por outro lado, temos como consequência muitos jovens e
crianças que já perderam algum parente próximo ou até mesmo os pais vítimas do câncer ou da
AIDS.
Perguntamo-nos: Como a morte é trabalhada com essas crianças
e com esses jovens?
No caso da AIDS, há muitas crianças e jovens cujos pais são soropositivos,
e em muitos casos eles próprios são soropositivos para a doença e têm que
viver com essa condição, embora
ainda não estejam preparados para enfrentá-la.
Muitas crianças e jovens vivem e convivem com a doença, tendo
sempre a morte como uma possibilidade muito presente, além de terem que lidar com o
luto de pais, amigos e parentes
nessas condições.
Penso nas crianças que sofrem o estigma de conviver com essa
“tarja preta” da orfandade da AIDS.
Como constroem seu percurso e como lidam com a perda
do(s) pai(s) por causa de uma doença que, socialmente, é vista como resultado de uma
vida promíscua?
Comecei a refletir sobre a formação do indivíduo e, então, a
percorrer a seguinte linha de pensamento: seria interessante que as várias mortes com as quais
a criança se depara em seu
dia a dia pudessem ser trabalhadas, para que ela fosse
preparada desde cedo a enfrentar esse tema.
Nesse contexto, o termo morte adquire um conceito bem mais
amplo, abrangendo não só a morte física como também as mortes simbólicas, envolvendo
perdas, dores e frustrações.
Ao longo da infância, a criança, muitas vezes, se depara não
só com a morte de seu bichinho de estimação ou de uma pessoa importante, mas também com a
separação dos pais (morte de
uma família constituída), a dor da diferença (sofrimento
decorrente do fato de ser diferente) ou a impossibilidade de conseguir algo.
Tais frustrações, dores, perdas e mortes provocam sofrimento
e dores psíquicas e, algumas vezes, levam a mudanças e reformulações na vida da criança.
Portanto, parto da premissa de que, com adultos que saibam
compreender essas várias mortes, provavelmente a criança estaria mais bem preparada
para enfrentar perdas.
Além disso, poderia elaborar o processo de luto com mais
facilidade e, provavelmente, também conseguiria se relacionar melhor com as situações
inevitáveis, sendo capaz de encarar a morte como algo que faz parte do processo do viver.
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Editora: Idéias & Letras
Boa leitura!
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