Ontem chorei.
Por tudo que fomos.
Por tudo o que não
conseguimos ser.
Por tudo que se perdeu.
Por termos nos perdido.
Pelo que queríamos que
fosse e não foi.
Pela renúncia.
Por valores não dados.
Por erros cometidos.
Acertos não
comemorados.
Palavras dissipadas.
Versos brancos.
Chorei pela guerra
cotidiana.
Pelas tentativas de
sobrevivência.
Pelos apelos de paz não
atendidos.
Pelo amor derramado.
Pelo amor ofendido e
aprisionado.
Pelo amor perdido.
Pelo respeito
empoeirado em cima da estante.
Pelo carinho esquecido
junto das cartas envelhecidas no guarda- roupa.
Pelos sonhos
desafinados, estremecidos e adiados.
Pela culpa.
Toda a culpa. Minha.
Sua. Nossa culpa.
Por tudo que foi e
voou. E não volta mais, pois que hoje é já outro dia.
Chorei.
(Caio Fernando Abreu)
* * *
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