A escultura “O último
adeus”, de Alfredo Oliani, está no túmulo da Família Cantarella, no
Cemitério São Paulo. (...)
Ao nos depararmos com o enorme casal de bronze representado
em “O último adeus”, a primeira idéia
que vem à mente é de um homem que perdeu a mulher amada.
É isso que vemos. Um homem jovem, vigoroso, nu (os detalhes
perfeitos da musculatura impressionam) beijando uma mulher, também jovem, de
olhos fechados, já morta.
Mas, na realidade, aconteceu o contrário.
A obra foi encomendada por Maria Cantarella, viúva de
Antonino Cantarella, falecido em 1942.
Os papéis são invertidos. Parece-me que ela quis representar
não só a imortalidade do amor e da paixão do casal, mas apresentar,
principalmente, a quem vê o monumento, o homem de sua vida em todo seu vigor,
pleno, vivo.
E ela, morta.
Talvez seja uma representação mais perfeita da saudade.
Quem fica é condenado a uma morte em vida.
“Ao Nino, meu esposo,
meu guia e motivo eterno de minha saudade e de meu pranto” - são os dizeres
na lápide ao lado.
Maria, dez anos mais jovem, só se juntaria ao amado quatro décadas depois.
*
Sempre gosto de lembrar: cemitérios são museus.
Além das interpretações que a história – contrária ao que se
vê – pode gerar, surgem outras dúvidas.
Infelizmente, a ação de vândalos contribui em muito para
apagar os registros históricos mais visíveis.
Muitas vezes, o visitante comum sequer saberá quando o
homenageado nasceu ou faleceu, já que os números ou placas com datas são
arrancados.
No caso de “O último
adeus”, isso me chamou bastante atenção.
Na sepultura, a data de morte de Nino aparecia da seguinte
maneira: 23-*2-1*4* (onde os asteriscos representam os números arrancados).
Tudo que se poderia dizer é que havia morrido na antevéspera
do Natal de algum ano na década de 1940.
Mas há uma informação que confunde
ainda mais. Na base do monumento, lê-se: A. OLIANI – S. PAULO 30-06-928. Como a
estátua teria sido feita em 1928 (não há o “1” no entalhe) se foi encomendada
após a morte de Nino, em 1942?
Um pouco mais de conhecimento histórico-biográfico e a
confusão aumenta.
Em 1928, Alfredo Oliani tinha apenas 22 anos de idade e
estava iniciando seus estudos.
Obra criada em 1928, mas só executada em 1942
após a encomenda? Entalhe feito posteriormente com data errada?
A atenção a esses detalhes levam a novas visitas, às buscas
nos arquivos dos cemitérios, ao estudo da vida e da obra dos artistas, à
familiarização com seu estilo, ao reconhecimento de outras obras sem que se
precise conferir a assinatura…
Histórias pessoais e História da Arte é o que encontramos em
cemitérios.
São cheios de vida e de vidas.
(texto de Sandro Fortunato)
* * *
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