"O fanatismo é o procedimento, a qualidade e o caráter intolerante e cego do religioso.
Entusiasmado e apaixonado pelas idéias que aceitou, é incapaz de examinar qualquer pensamento, princípio, ou ideal que não estejam estritamente contidos na sua doutrina.
Sua vida de relação se faz extremamente difícil, em face da sua presunção de superioridade com referência a tudo que o cerca."
(Juvanir Borges de Souza)
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As religiões, entendidas como crenças na existência de seres superiores ou forças criadoras do Universo, e que devem ser adorados e obedecidos, criaram suas doutrinas, cada qual com seus preceitos ético-morais e reverências às coisas sagradas.
As religiões geram, em seus seguidores, sistemas de pensamentos que levam a posicionamentos filosóficos, éticos e metafísicos, influindo poderosamente na maneira individual e coletiva de agir.
Assim, quanto mais próximas estiverem as doutrinas religiosas da Verdade e da realidade, melhores serão suas influências sobre seus adeptos.
Hoje, à luz da Revelação Espírita, sabemos que todas as grandes religiões do mundo, desde as mais remotas eras, tiveram, em seus fundadores, os missionários encarregados de orientar e ajudar parcelas da Humanidade a progredir em conhecimentos e sentimentos.
Mas o auxílio do Alto nunca ultrapassou a capacidade de entendimento e absorção dos ensinos por parte daqueles aos quais era dirigido. Esse fato explica a linguagem figurada, sujeita a interpretações e estudos mais aprofundados a respeito dos textos religiosos antigos.
Moisés, Maomé, Buda, Lao-Tsé e todos os demais enviados por Jesus, o Cristo – Governador da Terra – utilizaram linguagem inteligível à época em que cumpriram suas missões.
Entretanto, transformadas as condições do mundo em que atuaram e deixaram suas mensagens e ensinos, pelo progresso natural, pelas modificações dos usos, costumes e leis humanas, pelos descobrimentos científicos e pela evolução geral do Planeta e de seus habitantes, é necessário que se interpretem os textos antigos dos livros sagrados das religiões em suas significações legítimas.
As interpretações literais de textos escritos há milênios, sem os cuidados naturais para se buscar a significação real, levam a enganos e erros como decorrências normais.
Há que se considerar também a evolução natural das línguas em que foram expressos os textos, entre as quais algumas estão extintas.
Outra dificuldade ocorrente é a das traduções dos textos originais para as línguas atuais, muito mais ricas que as antigas, nas quais um vocábulo tem hoje significações diversas. Daí a diversidade das traduções.
Essas considerações visam focalizar verdadeiros paradoxos que se observam no seio de determinadas religiões, os quais se tornam incompreensíveis ou inexplicáveis perante a finalidade visada pelos princípios religiosos, que é o da elevação dos sentimentos e dos conhecimentos da criatura humana.
Referimo-nos ao fanatismo, ao radicalismo e ao fundamentalismo que se observam em determinados movimentos religiosos, gerando consequências negativas e diversificadas no seio de grande parte da Humanidade.
O fanatismo é o procedimento, a qualidade e o caráter intolerante e cego do religioso.
Entusiasmado e apaixonado pelas ideias que aceitou, é incapaz de examinar qualquer pensamento, princípio, ou ideal que não estejam estritamente contidos na sua doutrina.
Sua vida de relação se faz extremamente difícil, em face da sua presunção de superioridade com referência a tudo que o cerca.
Próximo do fanatismo encontra-se o radicalismo daqueles cuja opinião ou comportamento os tornam inflexíveis, mesmo diante de evidências e provas contrárias ao ponto de vista que aceitaram.
Fanatismo e radicalismo são males que se enraízam nos movimentos religiosos, com graves prejuízos para os invigilantes que os aceitam e para aqueles que com eles se relacionam.
Aos prejuízos das interpretações literais do Velho e do Novo Testamentos somaram-se os equívocos das igrejas denominadas cristãs, com suas estruturas e hierarquias tradicionais, criando as organizações religiosas que se desviaram do Cristianismo autêntico, resultante dos ensinos do Cristo de Deus.
Os dogmas impróprios criados pelos diversos Concílios, desde os primeiros séculos do Cristianismo, desfiguraram a mensagem do Cristo de tal forma que se torna difícil identificá-la, na sua pureza, com as práticas e cultos exteriores das igrejas.
Não se ajustam os ensinos do Mestre Incomparável, resumidos por Ele mesmo no “amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”, com as ideias e as práticas resultantes da interpretação literal dos Evangelhos e do Velho Testamento.
A interpretação que se deu às palavras céu, inferno, anjos, demônios, penitência, dia do juízo e tantas outras constantes dos Evangelhos, na sua letra, sem se considerar que Jesus se dirigia a pessoas de parco entendimento e que sua linguagem tinha, tantas vezes, sentido figurado para ser entendida, levou as doutrinas católica e protestante a erros e enganos evidentes.
Céu e inferno, por exemplo, não podem ser considerados lugares determinados ao gozo eterno ou ao sofrimento eterno das almas, como entendem as igrejas, mas sim estados de alma, resultantes de seus pensamentos e ações no bem ou no mal.
Penitência não deve ter o sentido de simples castigo pelo mal feito, mas sim o de arrependimento, sem prejuízo da retificação necessária.
Anjos são Espíritos que já se encontram em avançados estágios evolutivos, mas que iniciaram sua trajetória como seres simples e ignorantes e não como criaturas especiais do Criador.
Demônios são Espíritos que se desviaram, comprazem-se no mal, mas que terão oportunidade de se redimir, dentro da lei de Deus, que é justa e equitativa para com toda a Criação.
O juízo não é um julgamento especial em um tempo indefinido dentro da eternidade, mas sim as consequências dos atos e pensamentos de cada ser pelo automatismo das leis divinas, às quais todas as criaturas estão sujeitas.
Essas noções retificadoras das doutrinas baseadas na literalidade das escrituras antigas foram trazidas pelo Consolador, prometido por Jesus, que sabia da necessidade futura do correto entendimento de seus ensinos, que se ajustam perfeitamente ao Amor, ao Poder e à Justiça de Deus.
A interpretação radical dos fundamentos, assim considerada a letra das escrituras, corresponde ao imobilismo de ideias superadas pelo progresso normal do mundo que habitamos, resultante de novos conhecimentos oriundos das ciências e novas revelações.
O fundamentalismo resultante da interpretação literal, quando se junta à força do poder temporário, conduz povos, raças e nações à violência e às guerras, como ocorreu no passado e ainda acontece no presente.
Fundamentalismo tornou-se sinônimo de radicalismo.
Suas consequências são incompatíveis com os objetivos das religiões, que visam o progresso moral e intelectual do homem, na busca da felicidade das criaturas de Deus.
O fundamentalismo não ficou adstrito a determinados movimentos religiosos denominados cristãos.
Fenômeno semelhante ocorre no movimento islâmico, com base na interpretação literal e radical de seu livro sagrado. Como o Alcorão foi escrito no século VII da Era Cristã, quando o mundo era ainda muito mais atrasado que na atualidade, torna-se evidente a necessidade do ajustamento de suas normas e regras às novas condições de conhecimentos e de sentimentos alcançados pelo gênero humano, que conduzem ao Bem.
Também no islamismo ou em qualquer outro movimento religioso não se justificam os fundamentos interpretados literalmente.
Devem ser considerados os mandamentos, a letra, à luz da razão, da justiça e do entendimento superior, sem o que os resultados interpretativos levam a verdadeiros absurdos, como é exemplo a condição da mulher, colocada em posição de inferioridade injustificada, atendendo a costumes de um passado superado.
Apesar do progresso alcançado pela Humanidade, em pleno século XXI subsistem tendências relativistas, utilitaristas e subjetivistas difundidas nas sociedades atuais, com pretensões de legitimidade social, cultural e religiosa.
O Espiritismo, a Terceira Revelação nos tempos modernos, oriundo da Espiritualidade superior, vem mostrar, aos homens que despertam, a realidade da vida e sua continuidade infinita, procurando retificar tendências e erros provenientes do passado milenar.
Não se justifica o relativismo diante da lei moral superior do Amor, que provém do Criador do Universo e foi ensinada pelo Cristo.
O fundamentalismo, o utilitarismo, o subjetivismo e o materialismo são desvios perigosos de vivência e de interpretações infelizes, com consequências sérias para quem os aceita, contra os quais estão sempre presentes a mensagem do Cristo e a Doutrina Consoladora por Ele prometida e enviada.
Não é fácil para os que se encontram reencarnados em um mundo material como a Terra, com inúmeras obrigações perante a vida física, lembrarem-se permanentemente de que são, antes de tudo, seres espirituais em trânsito por este mundo.
Essa é a condição de toda a população terrena: Espíritos eternos, ligados a corpos materiais perecíveis, em busca do aperfeiçoamento.
As religiões auxiliam esse entendimento lembrando-nos do que somos em essência.
Mas as religiões não dispõem de todo o conhecimento, estando sujeitas a desvios, como os fatos o comprovam.
Daí o auxílio do Alto, que se manifestou em todas as épocas, através de emissários e missionários do Cristo, com o objetivo de esclarecer parcelas da Humanidade e anular as influências inferiores.
A vida em mundos de expiações e provas, como o nosso, apresenta as dificuldades naturais do campo material, reclamando esforço de aprendizagem, trabalho e dedicação, na vasta lavoura terrena, além dos serviços necessários à aquisição dos valores espirituais que representam o verdadeiro progresso da alma. [...]
É nessa esfera de provas e expiações que os espíritas, pequena minoria da população global, são chamados a atuar numa tarefa ingente, difícil, mas não impossível.
É a luta por um ideal superior na difusão da Verdade para toda a Humanidade.
Se o progresso é lei divina para todas as criaturas, o conhecimento de nós mesmos impõe-nos deveres diversos, inclusive o de auxiliar nossos semelhantes.
(Juvanir Borges de Souza)
Fonte: O Reformador- mar/2010
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