O caso serve para ilustrar o aspecto melindroso dos
desempenhos nos trabalhos de desobsessão e doutrinação de desencarnados em
desorientação em algumas casas espíritas.
Isto porque, no decorrer do tempo em que frequentei e
participei de sessões assim, pude observar que, dentre as muitas ocorrências
havidas, acontecia vez por outra dos mentores e guias dos pacientes se
manifestarem, em pessoa, por intermédio do médium incorporador diante do
doutrinador, em lugar de algum esperado obsessor ou espírito necessitado de
auxílio, embora sejam estes os que vêm em maior número a este gênero
confraterno de trabalhos mediúnicos.
Aconteceu certa vez com minha mãe.
Ela realizava tratamentos em determinado endereço espírita
que, agora, não vem ao caso, porque foi lá também que houve o episódio dúbio
que relatarei em seguida, e não se condena um prédio pela fragilidade de um
tijolo.
Acomodando-se diante de ambos os trabalhadores da Casa, em
obediência a bateria de sessões necessárias ao trabalho de doutrinação e
profilaxia espiritual realizado normalmente com todos que procuravam aquela
instituição, para seu profundo encanto, e admiração dos médiuns presentes, quem
incorporou foi um guia, que evidenciava grande iluminação íntima.
Provavelmente um dos mentores desencarnados da própria Casa!
Estando minha mãe, na época, usufruindo tratamento de feição
espiritual que muitos buscam, naqueles períodos de maior turbulência e desafios
a serem enfrentados na vida, de ordem física ou emocional, surpreendeu-se, ela,
da presença justo daquele amigo das esferas invisíveis que, espontaneamente,
tomou lugar frente ao médium doutrinador.
Este, em percebendo a ocasião feliz e particularmente
incomum, deixou a palavra ao visitante; e ele dirigiu à minha emocionada
genitora aconselhamentos e esclarecimentos de indubitáveis valor e utilidade,
dos quais até hoje ela não se esquece!
Todavia, tempos depois, em época na qual, em pleno
florescimento da sensibilidade mediúnica própria, já me via mergulhada em
estudos incessantes e nos eventos espontâneos de manifestação do meu mentor,
Caio Fábio Quinto, por intermédio da psicografia, eis que o episódio se repete,
também comigo, na mesma Casa.
Incompreensível, porém, fora a reação da médium
doutrinadora, vindo provar que, em questões de doutrinação e recepção de
desencarnados em trabalhos deste teor, grande deve ser o preparo, e a
constatação patente da sensibilidade dos candidatos a este gênero de
atividades.
Todos se acomodaram para o início da sessão de incorporação.
A médium doutrinadora pronunciou a prece do hábito, e,
passados alguns segundos, sob a minha expectativa atenta, o visitante se
manifestou através do médium de incorporação, principiando uma saudação e um
esclarecimento no sentido de que era um meu conhecido, permanecendo próximo a
mim dado a algum tipo de afinidade que principiava a descrever...
Não findou as primeiras palavras, e a trabalhadora, em tom
austero e quase acusatório, o interrompeu, perguntando:
- E o que você fez para que exista esta afinidade, para que
ela goste da sua presença?!...
De meu lado, acomodada já inquieta no assento que me fora
destinado, intuí na mesma hora que deveria se tratar daquele mesmo mentor que
já vinha acompanhando-me e orientando o desenvolvimento da minha sensibilidade
mediúnica para a escrita.
Todavia, não podia falar nada, porque o paciente nada podia
dizer no decurso da entrevista, segundo as regras da casa.
O espírito em manifestação, através do incorporador,
deteve-se - notei - como se algo
perplexo do que ouvia.
E ensaiou dizer alguma coisa a mais em tom cordato; mas já a
doutrinadora, inamovível de suas convicções prévias de que se tratava, todo
visitante, de algum tipo de obsessor, ou talvez algum súcubo ou íncubo, retomou
a palavra, e, decidida, procedeu ao arremate usual de doutrinação ao qual mais
de uma vez já presenciara, não apenas nos episódios de minhas sessões, como nas
de que ouvi contar de outros:
- Veja, meu irmão! Veja o que pode acontecer com você se
continuar ao lado dela! Atente no seu futuro!
Na época, não entendi bem a que ela aludia.
Compreendi, depois, tratar-se, aquela providência, de algum
tipo de recurso de que os trabalhadores da Casa lançavam mão, no sentido de
projetar a consciência do espírito em manifestação para a visualização futura
das possíveis consequências dos seus malfeitos junto aos reencarnados aos quais
obsidiavam.
O visitante, neste ponto - observei - após mais alguns
instantes em silêncio, comentou algo em concordância. Qualquer coisa próxima a
um "compreendo", sem maiores anotações.
Despediu-se em seguida.
Mais tarde compreendi, com maior lucidez sobre o episódio
equivocado, que só lhe restou esta opção, por respeito a um impasse originado
nas limitações óbvias da médium, que o impediu de extrair o proveito
pretendido, qual, talvez, o de me dirigir alguma palavra orientadora para
aquela fase de minha vida.
Saí do episódio francamente confusa, sem entender bem.
E, só mais tarde, pude compreender que fora a minha
sensibilidade, naquela situação, mais aguçada para a identificação da
manifestação do mentor querido, e mais reveladora da realidade do que
acontecia, do que o treinamento talvez bem intencionado e exaustivo daquela
médium da Casa espírita, visto que a sua percepção mediúnica e interpretação de
contexto foram inteiramente equivocadas na ocasião.
O leitor conhecedor de algo dos trabalhos deste teor em outras instituições poderia alegar que
talvez se tratasse mesmo da visita insidiosa de algum obsessor.
Todavia, a isto
argumento que, já naquela época, eu mesma conseguia distinguir com algum
acerto, via sensibilidade sendo francamente desenvolvida neste sentido, uma
presença de padrão obsessivo, ou algo diferente.
Fisicamente sentia o efeito das energias nocivas.
E, durante o período em que frequentei aquela bateria de
trabalhos da Casa, aconteceu destes se fazerem presentes, vez ou outra. Houve o
caso de uma obsessora encarniçada baixar no médium, transcendendo ressentimento
flagrante na própria entonação de voz.
Alegava estar me cobrando alguma dívida, não dela mesma, mas
contra algum malfeito de passado que comprometeu algum afeiçoado seu.
Com esta, assim, não havia dúvidas; e o trabalho de
doutrinação se fez longo, melindroso, mas eficiente.
Muitas nuances, portanto, denunciam ao paciente estudioso, e
não alheio às particularidades mediúnicas das próprias vivências, de quem se
trata os que comparecem para nos dirigir palavras de alento, orientação, ou,
por outra, acusações agressivas ou intenções de vindita.
Porque não fazem por
onde ocultar, via de regra, ali, onde diante dos guias da Casa nada pode ser
dissimulado, as suas reais intenções.
Mas o visitante daquele dia, de início, já se fazia polido e
cordato.
O teor do que enunciava evidenciou, logo nos primeiros
momentos, os objetivos pacíficos de sua visitação.
Como normalmente é difícil encontrar uma Casa Espírita
dispondo de alguma sessão específica para que os mentores e guias possam se
manifestar, naquele endereço em particular, pelo visto, eles utilizavam os
trabalhos desobsessivos para somar sua intercessão luminosa aos esforços dos
médiuns.
Então, totalmente precipitada fora a atitude da médium que o
recebeu, por antecipação, como obsessor.
Serve para reflexão.
(Christina Nunes - meridius@superig.com.br)
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