Macaco, uma banana!!!
Daniel Alves é um
excelente jogador desse tempo. O Barcelona é um grande time de
futebol, e o seria em vários tempos.
O preconceito sempre
existiu, enquanto o racismo, do ponto de vista histórico, é mais
recente.
Nesse tempo atual,
Daniel, preconceito, racismo, futebol e Barcelona se encontraram.
E não foi a primeira
vez.
A atitude do jogador
brasileiro , ao comer uma banana que lhe havia sido atirada com
objetivos ofensivos foi pensadamente espontânea.
Uma resposta dada em
segundos para uma agressão que dura séculos.
Agressão essa, que se
manifesta em objetos atirados contra pessoas, em abordagens policiais
injustas e com desfechos dos mais diversos, em esforços para manter
pessoas em subempregos, sem escolas, sem saúde, sem teto, sem terra,
sem cidadania; mas que se manifesta, mas comumente, em forma de
impropérios, xingamentos racistas feitos de uma distância segura,
mas que cumprem sua função de diminuir quem já está oprimido por
um esquema racialista planejado.
Proeminentes colegas de
profissão de Daniel, jornalistas, apresentadores de programas,
políticos entre outros, alguns bem intencionados, outros não, se
apressaram em lançar a campanha: “somos todos macacos”.
Essa é uma campanha a
qual eu não poderia aderir por vários motivos, mas o simples deles
é: Não sou macaco. Sou uma pessoa.
Um torcedor fascista,
frustrado e criminoso do outro lado do mundo não tem condições de
me convencer do contrário.
Preconceito e racismo
se combatem com Políticas de inclusão, leis punitivas realmente
duras e de fácil aplicação, e com muita educação, em todos os
aspectos que esse conceito tem. Campanhas tontas e algo cínicas só
atrapalham o combate a esse complicado problema humano.
Não sei de quem partiu
essa ideia idiota, de animalizar a todos baseada em atos de
psicopatas em estádios de futebol (o que tem muito, hoje em dia).
Mas o fato é que ela servirá aos mais diversos interesses, nenhum
deles bom.
Vejo pessoas que têm
empresas e/ou programas de televisão que poderiam empregar ao menos
um negro em um cargo importante aderirem à campanha. Vejo
jornalistas que combatem duramente o programa de cotas ou qualquer
ação afirmativa aderirem também.
E por quê? Tirando os
companheiros de profissão de Alves, cuja única perspectiva que eu
alimento em relação a eles é uma boa atuação na Copa, e foram
orientados por uma agência de propaganda que disse que a melhor
forma de se combater preconceito é acabar com a palavra, seja lá o
que isso signifique, quem são os demais?
Nunca havia visto a
prontidão de certos setores em apoiar uma ação antirracista sem
contemporizar ou pedir calma aos ditos “radicais”.
Mas eu sei, sim, o
porquê. Ouvi um cantor sertanejo dizer, enquanto comia bananas em
apoio à causa, que essas ações, tanto a do jogador quanto a
campanha, eram perfeitas porque seguiam os preceitos de Ghandi, de
apanhar sem reagir.
A apresentadora
concordou com um discurso vazio enquanto um humorista, também
comendo dessa fruta, fazia sinal de aprovação.
A plateia aplaudia,
enquanto recebia unidades do mesmo alimento.
Ao longo do dia, todo
tipo de pessoas, insisto, todo tipo, se apresentava para a batalha
contra o mal com a única arma exigida: uma foto postada em redes
sociais comendo banana. Não, não somos macacos. Pensamos e
raciocinamos.
A elite nacional e os
pobres de espírito querem nos convencer de que somos todos iguais,
todos “macacos” , que somos um povo unido e a questão do racismo
se resume em falta de cortesia de torcedores em terras estrangeiras.
Basta portanto, ignorar
ou devolver a ofensa, de preferência, de forma bem humorada.
Não, não somos
macacos. Somos inteligentes.
Sabemos quais as
causas, históricas e atuais que fizeram com que uma das únicas
maneiras de ascensão do negro fosse através do futebol.
Se dependesse da turma
dessa campanha, nem essa o seria. Porque foram e são contra todas as
políticas que visem diminuir a desigualdade racial nesse país. Mas
sejamos justos, também são contra diminuir a desigualdade social,
de gênero, regional, ou qualquer fator que emancipe pobres,
principalmente se esses forem negros.
Não, não somos
macacos. Temos bom senso.
Sabemos que muitos que
aderiram o fizeram de boa fé. Mas sabemos que as estrelas que
aparecem nesse momento não têm em seus corpos de assessoria nenhum
negro. Pesquisem.
O único nordestino em
que votaram foi Fernando Collor. Pesquisem.
Acham que não são
racistas porque têm motoristas e seguranças negros. Perguntem a
eles, se puderem. Eles mesmo dirão isso.
Não, não somos
macacos. Gente é o que somos.
Nenhum racista vai nos
convencer do contrário.
Elias Candido*
*professor, militante da Igualdade Racial e presidente do Diretório
Zonal do PT em V. Matilde.
* * *
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