"Nós não somos seres humanos tendo uma experiência espiritual. Somos seres espirituais tendo uma experiência humana"

(Teillard de Chardin)

13 novembro 2012

Bom humor espírita





Henri Sausse registrou na biografia de Allan Kardec que, embora o Codificador do Espiritismo fosse digno e sóbrio e se ocupasse com assuntos elevados, “gostava de rir com esse belo riso franco, largo e comunicativo, e possuía um talento todo particular em fazer os outros partilharem do seu bom humor”.

Aqui no Brasil, nós tivemos, no meio espírita, os bons exemplos de Chico Xavier. Narram os seus biógrafos que embora ele estive sempre ocupado com as suas atividades mediúnicas nobres, sabia conservar a gentileza, esbanjar simpatia e manter o bom humor com todas as pessoas que o procuravam ou o cercavam. Assim, melhorava a confiança, a esperança e a alegria na alma das pessoas que se achegavam ao seu amor e carinho.

Fora do meio espírita, talvez o exemplo mais relevante do valor do bom humor esteja nas ações dos “Doutores do Riso”. Estimulando-o, conseguem despertar a alegria para que pessoas doentes melhorem o sistema imunológico, superem estados depressivos, elevem os sentimentos, as emoções e os pensamentos favorecendo a recuperação da saúde física e mental e da qualidade de vida.

Dessa forma, o bom humor, acompanhado sempre do equilíbrio e do bom senso, deve ser exteriorizado por nós no lar, no ambiente de trabalho e no convívio e no relacionamento com as pessoas que nos cercam, inclusive nas atividades do Centro Espírita.

Quem de nós não conhece alguns espíritas que souberam ou sabem fazer preleções doutrinárias ou evangélicas com notável senso de humor, tornando-as descontraídas, agradáveis, proveitosas e inesquecíveis?

Que ante a situações constrangedoras, superam-nas com extraordinário bom humor? Que no atendimento às pessoas enfermas, tristes ou depressivas, usam doses certas de bom humor, para aconselhar, dissipar as trevas na mente e recuperar o ânimo, a alegria, o sorriso, a saúde espiritual e o bem-estar?

Portanto, o bom humor deve estar em nosso estado da alma e entre as nossas atitudes mentais elevadas. Assim, o trabalho rende mais; a prática da caridade e do bem frutifica melhor; os deveres morais são cumpridos com descontração; e a convivência com os semelhantes fica mais amena e saudável.

E quanto às manifestações humorísticas dos semelhantes, lembremo-nos sempre da lição do Espírito Mariano José Pereira da Fonseca, psicografada por Chico Xavier e contida no Capítulo “Reflexões”, do livro “Falando à Terra”: “Não arruínes o bom humor de quem segue ao teu lado, porque a alegria é sempre um medicamento de Deus”.


(Geziel Andrade)



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09 novembro 2012

Tortura e Glória - Clarice Lispector



Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos. Veio a ter um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas.

Como se não bastasse, enchia os bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria.

Pouco aproveitava.

E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de algum livrinho, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima com paisagem de Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como data natalícia e saudade.

Mas que talento tinha para a crueldade.

Ela toda era pura vingança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo.

Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia.

Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía “As reinações de Narizinho”.

Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele, comendo-o, dormindo-o. E completamente acima de minhas posses.

Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria. Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança da alegria: eu não vivia, eu nadava devagar num mar suave.

No dia seguinte fui à sua casa, literalmente correndo. Ela não morava num sobrado como eu, e sim numa casa.

Não me mandou entrar. Olhando bem para meus olhos, disse-me que "havia emprestado o livro a outra menina, e que eu voltasse no dia seguinte para buscá-lo". Boquiaberta, saí devagar, mas em breve a esperança de novo me tomava toda e eu recomeçava na rua a andar pulando, que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de Recife.

Dessa vez nem caí: guiava-me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes eram a minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pulando pelas ruas como sempre e não caí nenhuma vez.

Bom, mas não ficou simplesmente nisso.

O plano secreto da filha do dono de livraria era tranqüilo e diabólico.

No dia seguinte lá estava eu à porta de sua casa, com um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro ainda não estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. 

Mal sabia eu como mais tarde, no decorrer da vida, o drama do dia seguinte ia se repetir com o coração batendo.

E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. 

Ela sabia que era tempo indefinido, enquanto o fel não escorresse de seu corpo grosso. Eu já começara a adivinhar que ela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer está precisando que eu sofra.

Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um dia sequer.

Às vezes ela dizia: "pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você não veio, de modo que o emprestei a outra menina". E eu, que não era dada a olheiras, sentia as olheiras se formando sob os meus olhos espantados.

Até que um dia, quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu sua mãe.

Esta devia estar estranhando a aparição muda e diária daquela menina à porta de sua casa. Pediu explicações a nós duas. Houve uma confusão silenciosa, entrecortada de palavras pouco
elucidativas.

A senhora achava cada vez mais estranho o fato de não entender. 

Até que essa mãe boa entendeu.

Voltou-se para a filha e com enorme surpresa exclamou: "mas este livro nunca saiu daqui de casa e você nem quis ler!" E o pior para ela não era essa descoberta. Devia ser a descoberta da filha que tinha.

Com certo horror nos espiava: a potência de perversidade de sua filha desconhecida, e a menina em pé à porta, exausta, ao vento das ruas de Recife.

Foi então que, se refazendo, disse firme e calma para a filha: "você vai emprestar agora mesmo 'As reinações de Narizinho' ”. E para mim disse tudo o que eu jamais poderia aspirar ouvir. “E você fica com o livro por quanto tempo quiser.”

Entendem? Valia mais do que me dar o livro: pelo tempo que eu quisesse é tudo o que uma pessoa, pequena ou grande, pode querer.

Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como sempre. Saí andando bem devagar. Sei que segurava o livro com as duas mãos, comprimindo-o contra o peito.

Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração estarrecido, pensativo.

Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter.

Horas depois abri-o, li algumas linhas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei mais comendo pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes.

Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada.

Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo.

Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante.


(Clarice Lispector, in “O Pequeno Livro das Grandes Emoções” - Unesco, VA)


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08 novembro 2012

Dica de livro: "A vida não é justa", de Andréa Pachá




Será lançado no dia 13 de novembro, o livro "A vida não é justa", de Andréa Pachá, juíza da 1ª Vara de Família de Petrópolis, no Rio de Janeiro, pela Editora Agir.

No livro encontramos histórias que a autora Andréa Pachá
presenciou, como juíza de Vara de Família, mas relatadas de uma forma humanizada e linguagem simples.

Em mais de 15 anos como magistrada, à frente de varas de família,  a autora testemunhou casos de amor, ódio, términos e recomeços. 

Num processo de terapia, a pessoa leva anos para se expor. Aí chega na frente de um juiz que nunca viu na vida e despeja tudo”, disse a juíza, 48 de idade, casada há 20 anos, o casal tem um filho de 16 e outro de 14.

Andréa foi vice-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros e conselheira do CNJ, tendo coordenado ações para aproximar o Poder Judiciário da população, como a criação do cadastro nacional de adoção e as campanhas de eleições limpas e simplificação da linguagem jurídica.

A seguir, uma das crônicas presentes no livro. 

Boa leitura!


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Reconciliação


Por Andréa Pachá, - juíza de Direito (RJ).



Sempre me senti muito desconfortável quando, nas separações consensuais, a lei me obrigava a perguntar ao casal se eles tinham certeza da decisão tomada.

Ora, se procuraram um advogado, estabeleceram as cláusulas da separação e ali estavam, na frente de um juiz, pra encurtar aquele período de desgaste, o que se esperava que fossem responder?

Tratava, então, de diminuir o constrangimento e começava, assim, as audiências:

- Desculpem, não quero parecer invasiva ou inconveniente, mas a lei manda que eu pergunte se vocês querem mesmo se separar.

Então prosseguia perguntando se eles ratificavam o acordo para, no mesmo ato, decretar a separação. Simples, rápido, sem qualquer rito especial, exceto pela exposição pública da frustração daqueles mortais que percebiam que a felicidade perene, o até que a morte nos separe, chegava ao fim sem pompa, sem música, sem convite e sem festa.

Dependendo do casal e do clima, me permitia um ou outro comentário pra aliviar a tensão e reduzir a dor da perda.

Sim, porque nossa tendência, após anos trabalhando na mesma atividade, é perder a capacidade de individualizar as dores e os conflitos que chegam às nossas mesas. 

Cada processo é um processo. Cada casal é um casal. Cada fim de casamento é um fim de mundo e cada audiência é única para aqueles que comparecem diante de um juiz e expõem as frustrações pela incapacidade de viver um grande amor.

É uma pena que o amor não acabe ao mesmo tempo para os dois. O amor acaba e ninguém avisa isso pra ninguém que pretende se casar. 

E a percepção do fim acontece de repente. Não se consegue estabelecer uma data, um fato, um porquê, mas de uma hora pra outra alguém constata que não dá um beijo na boca do outro há mais de um mês. 

Os prazeres tomam caminhos solitários e um não consegue sequer saber o que comove ou sensibiliza seu companheiro.

A rotina, a falta de dinheiro, problemas com os filhos adolescentes, desemprego, estresse, cansaço, a crise política, tudo parece conspirar para mascarar o diagnóstico e retardar a terrível constatação captada com perfeição pelo poeta... o nosso amor acabou, que coincidência é o amor, nossa música nunca mais tocou...

Daí pra frente, o casamento vira uma espécie de prorrogação, de terceiro tempo sem tempo pra terminar e dependendo da capacidade de suportar a vida pintada em bege, as relações podem até mesmo durar pela vida toda.

Tenho observado que, nos processos de separação, quando não há uma nova paixão avassaladora, as decisões são, na maioria das vezes, tomadas pelas mulheres. 

Observo, também, que quando a separação importa na redução da capacidade financeira, os casais têm optado pela manutenção da relação e procurado formas de convívio menos dolorosas.

Foi, portanto, com algum estranhamento, que vi entrar na sala de audiências o contador Robério e professora aposentada Idalina.

Trinta e oito anos de casamento, quatro filhas, todas casadas, seis netos, nenhum patrimônio para partilhar, nenhum pedido de pensão alimentícia. 

Na petição inicial, nenhum ressentimento declarado ou qualquer imputação de culpa. Pretendiam a separação por incompatibilidade de gênios.

Formulei, então, a burocrática pergunta: Querem mesmo se separar ou há possibilidade de reconciliação?

Silêncio. Idalina baixou a cabeça, encorajando Robério a se expressar.

- Ninguém quer se separar não, excelentíssima. Nem sei porque viemos aqui.

Estava tão acostumada com a repetição que, confesso, não sabia como prosseguir. Tentei me manter impávida e voltei à abordagem:

- Bem, se não querem se separar por que entraram com a ação?

- Essa mulher tá com a cabeça virada. Mas a gente já se acertou. Aliás, passamos uma noite maravilhosa - disse Robério, mal conseguindo conter o orgulho da virilidade naquela idade.

Idalina nada falava. Parecia distante e perdida. Decidi ser mais firme em apoio ao que imaginei fosse o desejo daquela mulher.

- Olha, seu Robério. Eu sei que esta decisão é muito difícil, que vocês viveram muitos anos juntos, mas, quando os dois não querem, acho impossível continuar casado. Vocês têm uma família grande, netos, mas quem sabe não é melhor cada um seguir sua vida, não é dona Idalina? - perguntei, cúmplice.

Pela primeira vez ela tomou as rédeas da situação e foi firme na intervenção.

- Não é melhor, não, doutora, melhor mesmo é continuar com ele.

Ela não sorria, não esboçava qualquer sinal que indicasse a felicidade do reencontro. Imaginei que pudesse estar pressionada ou submetida ao poder daquele que exerceu o controle de uma vida inteira. Decidi que seria solidária e transmitiria a Idalina, a segurança de que ela tanto precisava.

É claro que aquele comportamento não integrava meus deveres funcionais. No entanto, a magistratura era uma das muitas funções que eu exercia na vida e é claro que todas as minhas virtudes e vícios transpareciam de alguma forma no exercício da profissão. 

Naquela ocasião, atuei parcialmente em favor de Idalina para compensar as diferenças daquela relação que intui tão desigual e prossegui:

- O respeito é sempre muito importante. E vocês devem continuar sendo amigos. Se as coisas mudarem, quem sabe até voltam a namorar?

- Eu não quero me separar mas preciso falar umas coisas. Por isso vim aqui.

Robério coçou a cabeça como uma criança que se prepara para um sermão.

- Eu não aguento mais tanta falta de atenção. Eu só quis me separar porque me sinto muito sozinha. As crianças foram embora. A casa tá vazia. A gente mal se fala. 
Almoço e janta com a televisão ligada. Tudo que eu falo ele não escuta. Mas a gota d'agua é o futebol. Eu não suporto futebol todo dia. 
Enquanto ele assistia ao jogo no mês passado, disse que estava saindo de casa. Sabe o que ele respondeu? Nada. Pediu que eu saísse da frente porque tinha sido impedimento... 
Dá pra acreditar? Impedimento?!!! Naquela mesma noite fui pra casa da minha filha e no dia seguinte procurei o advogado.

- Mas, D. Idalina, há quanto tempo ele assiste a futebol? - perguntei.

- A vida toda. Mais de vinte anos.

Não pude conter o riso. Pensei em meu pai e sua paixão alucinada pela peleja. Avaliei os riscos que corria.

- Ele é um homem bom, doutora. A gente lutou muito junto. Toda a vida e a gente nunca se largou. Ele nunca teve mulher na rua.

Robério, verdadeiramente sensibilizado, olhou para Idalina e quase num sussurro a fez lembrar da aquisição da casa, da única viagem de férias a Cabo Frio, da perda do filho homem num acidente de carro e do quanto, juntos, eles dividiram toda a vida. Os dois, de mãos dadas sobre a mesa, choravam.

Eu tentava me socorrer do conhecimento jurídico para retomar o rumo daquela audiência e só lembrava dos filmes e romances que lera pela vida afora. 

Entendi que sabia muito pouco da vida. Aquele casal se amava e esperava que, da minha autoridade, viesse uma resposta para o abismo que ali se instalou. Achei que não podia decepcioná-los.

- Olha aqui, pessoal. Eu não vou separar vocês, não. A gente combina o seguinte: suspendo o processo por 60 dias. Nesse período, o seu Robério só assiste aos jogos do Flamengo. No resto do tempo, vocês saem, passeiam um pouco pela cidade, almoçam domingo na casa das filhas, ajudam com os netos. Tá bom assim?

Aliviados, os dois nem me olharam. Estavam encantados um pelo outro.

Nem o advogado nem o Ministério Público discordaram de decisão tão teratológica. Quem ousaria depois de presenciar tanto mistério?

Antes de sair, já do lado de fora da porta, Idalina me olha e, sorrindo, pergunta:

- É só jogo do Flamengo mesmo, né, doutora?


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Mérito



Boa noite.

Depois que cumpri as metas de trabalho que me foram confiadas, recebi permissão para visitar a Terra pela primeira vez desde minha desencarnação.

Fui designado a acompanhar uma caravana de socorro, onde teria alguns dias para ficar em minha antiga morada terrestre.

À hora determinada, juntei-me ao grupo de benfeitores e seguimos, deixando a cidade espiritual.

Caminhamos alguns passos fora dos limites da cidade e volitamos, eu pela primeira vez, amparado pelo grupo.

Incrível a sensação de se movimentar em velocidade tão alta quanto a luz, e sentir claramente a passagem das diversas camadas espirituais até chegar a crosta terrestre, incluindo o umbral. Este, mesmo que por uma fração de segundo, me fez relembrar a dor dos anos que vivi perdido ali, por causa da minha própria ignorância.

Ao chegar em cassa deparei com as crianças já crescidas, e com os demais com o rosto mais marcado pelo tempo.

Pude então finalmente entender que a vida não cessa, que estamos interligados a quem amamos verdadeiramente e que a morte física não rompe estes laços.

Estive ali, diante de minha família e pude, graças a Deus, despertar boas lembranças e espalhar bons fluídos a todos com minha presença.

Passei por aqui agora para dar este testemunho e dizer que estou extremamente feliz.

Agradeço aos benfeitores que operam a partir desta casa pela bendita oportunidade de acompanha-los nesta jornada de auxílio.


Ari.


(Psicografado por: Cleber P. Campos)




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07 novembro 2012

A missão espiritual de Barack Obama



Texto muito interessante publicado no “Jornal Comunica Ação Espírita”, em 03 de 2009, 72ª edição, mas que considero atual e que merece ser lido, para nossa reflexão.


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A missão espiritual de Barack Obama


(Por Wilson Czerski)


A simples possibilidade de eleição de um negro com nome árabe para a presidência dos EUA já mexia com o imaginário popular e criava expectativas entre políticos, empresários e líderes do mundo inteiro.

A confirmação veio pelas urnas e depois a posse como um dos acontecimentos mais surpreendentes da vida mundial recente.

É cedo para avaliar se Obama poderá aplacar, ao menos, as necessidades mais urgentes que se impõem a uma sociedade cansada de guerras inúteis e assolada por uma das piores crises econômicas de todos os tempos.

E o mundo globalizado segue com a mesma ansiedade pois, quer queira-se ou não, o papel da superpotência é inegável e todos os habitantes do planeta dependem, em algum grau, do que acontece na terra do tio Sam.

Importante percorrermos os olhos por algumas das questões de “O Livro dos Espíritos” que tratam das missões.

Seria Barack um missionário? E seu antecessor, George W. Bush, com sua arrogância e forte inspiração religiosa também teve a sua? As críticas a ele dirigidas significam que fracassou na sua execução? E o nosso presidente Lula é também um missionário? Muitos trechos de seus discursos parecem indicar que ele próprio acredita estar revestido desse messianismo.

Antes de mais nada é preciso entender que missionário não é somente aquele encarregado de expressivas realizações no campo da religião, do humanismo, da ciência ou das lideranças em diversas searas da atividade humana, inclusive política e militar.

Certamente que Gandhi, Joana D’Arc, Napoleão, Shakespeare, os papas, Chico Xavier, Einstein, Madre Teresa, Lincoln, Allan Kardec, Martin Luther King, Mozart e centenas de outras personalidades que desfilaram no palco terrestre foram missionários.

Mas na questão 582, por exemplo, os Instrutores Espirituais ensinam que o simples exercício da paternidade, fato corriqueiro e ao alcance da quase totalidade das pessoas, se incluirmos aí a maternidade, constitui uma missão.

Já na Q. 571, quando Kardec indaga se somente Espíritos elevados cumprem missões, a resposta esclarece depender da importância da mesma. “O estafeta – exemplificam – cumpre também uma missão, mas que não é a do general”.


Neste sentido, todos somos missionários: nas responsabilidades familiares assumidas, na contribuição socioeconômica do nosso trabalho profissional e na forma como atendemos as suas exigências, transformando, às vezes, tarefas simples em exemplos de dedicação, dignidade, humildade, etc. Ou por abraçar e humanizar profissões como a medicina ou a carreira de professor.

Nosso papel missionário pode avançar para outros setores de atuação como na própria prática religiosa, na benemerência, no desenvolvimento de uma arte, na criação de uma solução para um problema da coletividade, tudo isto sem que o indivíduo seja alçado à fama e glória do reconhecimento público, mas é uma missão, ou várias, para as quais ele é chamado a desempenhar, geralmente, desde a fase antecedente à sua atual reencarnação por força de sugestões dos amigos espirituais bem como por sua própria solicitação.

Tudo isto encontra confirmação na Q. 573 sobre a missão dos Espíritos encarnados, uma vez que os desencarnados também as têm: a proteção e auxílio aos encarnados, tarefas em colônias espirituais, a própria codificação espírita por eles transmitida.

Mas daqueles que por aqui estão fisicamente, há missões para “instruir e ajudar no progresso os outros homens, melhorar suas instituições, mas não são mais ou menos importantes como o que cultiva a terra e o que governa”.

Na questão 575, ao elaborar a pergunta, Kardec explica que a missão, numa acepção mais restrita do termo, possui um caráter mais amplo, menos exclusivo ou pessoal.

Então, como se poderia reconhecer um missionário na Terra? Pelas grandes coisas que ele realiza, pelo progresso a que conduz seus semelhantes, respondem.

Também somos esclarecidos que pode haver vários candidatos à mesma missão.

Quando há um trabalho coletivo numa instituição espírita, por exemplo, talvez muitas destas pessoas possam ter sido reunidas para trabalhar juntas, mas a presidência de um país, mesmo considerando o transcorrer do tempo e as sucessões no cargo, bem poucos poderiam ser designados para ela.

Claro que não podemos falar em missão a ocupação do cargo máximo de um país quando realizado por vias alheias à vontade do povo.

A tomada de poder pela força e visando a pura satisfação de ambições pessoais ou é de iniciativa puramente humana ou, se havia uma expectativa positiva em relação a esse indivíduo, os meios empregados denunciam o completo fracasso da missão.


Porém, ainda assim, na Q. 584 encontramos que “um conquistador que não tem em vista senão satisfazer sua ambição e não recua diante de nenhuma calamidade que cause”, não deixa de ser “um instrumento de Deus que se serve dele para o cumprimento de seus desígnios” e até esses prejuízos causados, às vezes, são um meio de fazer um povo avançar mais depressa.” Ou seja, Deus sempre tira do Mal o Bem.


Outro detalhe: nem sempre o indivíduo é designado para uma missão importante antes do nascimento porque com freqüência ele se torna instrumento de um outro espírito para execução de determinada ação.

O exemplo dado em “O Livro dos Espíritos” é o de um escritor que está atualmente desencarnado e que não podendo escrever diretamente um livro útil, procura um encarnado apto a receber-lhe as inspirações. Entraríamos aí no terreno da mediunidade.

De outras ocasiões o indivíduo possui um objetivo vago e sua missão se desenha aos poucos e segundo as circunstâncias porque Deus e os agentes espirituais impelem-no pelo caminho.

É o que muitas vezes constatamos em tantos testemunhos pessoais. As coisas, dir-se-ia, conspiram para a pessoa chegar naquela situação, levando para isso talvez muitos anos ou a vida toda e tendo passado por trilhas tortuosas e inesperadas.

Porém, como sempre se pode fracassar na missão, é possível que muitos nunca cheguem a determinado ponto porque tomam desvios, deixam-se vencer por tentações, são seduzidos por outros projetos ou assaltados pelo desânimo, derrotados pela força de vontade insuficiente.

Em se tratando de missões especiais, consideradas como determinadas diretamente por Deus, visto que sempre se pode fracassar, Kardec pergunta (Q. 579) como pode Deus confiar nesta pessoa. A resposta é que Ele conhece profundamente todas as suas criaturas para ter certeza de que as escolhidas para certas tarefas não falharão.

Assim, é correto atribuir à presidência de Barack Obama o caráter de missão.

Se ele terá sucesso ou não, não sabemos. Mas Deus sabe.

Somos todos falíveis porque humanos e essa condição de imperfeição que carregamos impede-nos de fazer prognósticos.

Podemos errar na previsão e Obama na execução, até porque muita coisa não depende só da vontade dele. Mesmo que com a razão, tem que fazer política, há o Congresso e a sociedade, as pressões mundiais e seu poder físico e intelectual também são limitados.

Mas é uma esperança de dias melhores, com menos sobressaltos bélicos e mais cooperação, solidariedade, diálogo, paz e fraternidade.




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Um pouco de Victor Hugo...



A vida não passa de uma oportunidade de encontro;
só depois da morte se dá a junção;
os corpos apenas têm o abraço,
as almas têm o enlace.

(Victor Hugo)

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Ser como se já não fôssemos...



É preciso não esquecer nada:
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes,
nem a oração de cada instante.
É preciso não esquecer de ver a nova borboleta, nem o céu de sempre.
O que é preciso é esquecer o nosso rosto, o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo do nosso pulso.
O que é preciso esquecer é o dia carregado de atos, a idéia de recompensas e de glória.
O que é preciso é ser como se já não fôssemos, vigiados pelos próprios olhos, severos conosco, pois o resto... o resto não nos pertence.

(Cecília Meirelles)

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Cecília Meirelles nos faz pensar e viajar por entre suas palavras singelas e profundas.

Seria possível viver como se já não fôssemos, em um mundo de tangibilidade plena como o nosso?

Seria possível como que viver em dimensões diferentes ao mesmo tempo? E, será que já não vivemos?

Há uma parte de nós vivendo na esfera ponderável, da matéria, das necessidades de sobrevivência.

Há outra, habitante do eterno, onde os espelhos do mundo não refletem nada, imponderável, espiritual.

Viver como se já não fôssemos, pode significar estar no mundo, sem ser do mundo.

Dependemos do material para a sobrevivência, para a manutenção da encarnação.

Porém, nosso coração, nossas mais valiosas energias podem estar sendo investidas nessa vida maior, na vida eterna do Espírito imortal.

Quando investimos no amor, na doação, no sorriso para os infelizes ao nosso redor, estamos sendo como se já não fôssemos, pois estamos vivendo o espiritual, o permanente, acima do efêmero, do passageiro.

Quando investimos no autoconhecimento, buscando em nós, diariamente, o que precisa de reforma, estamos sendo como se já não fôssemos.

Quando não esperamos as recompensas e glórias do mundo, vivendo com leveza o dia carregado de atos, estamos sendo como se já não fôssemos.

Severos conosco, no sentido de vigiarmos nossos pensamentos e atos, dando conta de nossa própria administração.

Não a severidade que pune, que enche de culpa, mas aquela que previne e que corrige sempre, evitando perdermos tempo em caminhos infelizes.

E o resto... o resto não nos pertence.

Pertencem a Deus a Lei e a Justiça. 

Pertence à consciência de cada um seu próprio julgamento.

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Léon Denis, grande estudioso do Espiritismo, em sua obra “Depois da morte”, ensina:

Dolorosa, cheia de angústias para uns, a morte não é, para outros, senão um sono agradável seguido de um despertar silencioso.
O desprendimento é fácil para aquele que previamente se desligou das coisas deste mundo, para aquele que aspira aos bens espirituais e que cumpriu os seus deveres.
Há, ao contrário, luta, agonia prolongada no Espírito preso à Terra, que só conheceu os gozos materiais e deixou de preparar-se para essa viagem.

Ainda há tempo de escolher. Ainda há tempo de se preparar.

Pensemos nisso.


(Redação do Momento Espírita - com base no poema “É preciso não esquecer nada”, do livro “Poesia completa”, de Cecília Meirelles, ed. Nova Fronteira; e no cap. 30, do livro “Depois da morte”, de Léon Denis, ed. Feb.)




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Um pouco de Carl Sagan...



A ausência da evidência não significa a evidência da ausência.
(Carl Sagan)


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A ingenuidade ignorante e a ingenuidade sábia



Há duas espécies de ingenuidade.

Uma que ainda não percebeu todos os problemas e ainda não bateu a todas as portas do conhecimento.

E outra, de uma espécie mais elevada, que resulta da filosofia que, tendo olhado dentro de todos os problemas e procurado orientação em todas as esferas do conhecimento, chegou à conclusão de que não podemos explicar nada, mas temos de seguir as convicções cujo valor inerente nos fala de maneira irresistível.

(Albert Schweitzer, in “O Cristianismo e as Religiões do Mundo”)

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06 novembro 2012

A realidade do amor



Que sempre existam almas para as quais o amor seja também o contacto de duas poesias, a convergência de dois devaneios.

O amor, enquanto amor, nunca termina de se exprimir e exprime-se tanto melhor quanto mais poeticamente é sonhado.

Os devaneios de duas almas solitárias preparam a magia de amar. 

Um realista da paixão verá aí apenas fórmulas evanescentes. Mas não é menos verdade que as grandes paixões se preparam em grandes devaneios.

Mutilamos a realidade do amor quando a separamos de toda a sua irrealidade.

(Gaston Bachelard, in "A Poética do Devaneio")


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