"Nós não somos seres humanos tendo uma experiência espiritual. Somos seres espirituais tendo uma experiência humana"
(Teillard de Chardin)
05 julho 2014
Um pouco de Cecília Meireles...
Como se morre de velhice
ou de acidente ou de doença,
morro, Senhor, de indiferença.
Da indiferença deste mundo
onde o que se sente e se pensa
não tem eco, na ausência imensa.
Na ausência, areia movediça
onde se escreve igual sentença
para o que é vencido e o que vença.
Salva-me, Senhor, do horizonte
sem estímulo ou recompensa
onde o amor equivale à ofensa.
De boca amarga e de alma triste
sinto a minha própria presença
num céu de loucura suspensa.
(Já não se morre de velhice
nem de acidente nem de doença,
mas, Senhor, só de indiferença.)
(Cecília Meireles)
* * *
Para cuidadores de pessoas singulares
Não é fácil aceitar as diferenças.
O olhar do filho nos desnuda e a impotência é o que mais
incomoda.
Não saber lidar com a própria criação.
Não suportar mais a dor dele que vira nossa e nada poder
fazer. A dor de saber que ele é parte da gente e a gente parte dele. Um todo
dor compartilhada.
Imagens que se formam e que marcam vontades de estancar o
movimento pendular: o ir e vir sempre na instabilidade das doenças mentais
crônicas.
O fluxo dos pensamentos mágicos, o movimento apavorante
frente à vida, o choro excessivo sem haver motivo, a vontade de morrer.
O medo de sentir de novo a mesma dor é igual ao real sentir?
O medo de ser, o medo de sofrer, o medo de viver. E o viver? O que é isto? Qual
o verdadeiro sentido? Como iluminar encruzilhadas se os caminhos que bifurcam
são escuros. Todos. Bastaria uma vela para romper a escuridão? Uma pedrinha
brilhante a marcar caminho? Ou a coragem e a fé a mudar rota.
Mas qual a rota?
* * *
Quem cuida dos cuidadores?
Em geral as
pessoas entendem "curar" como o conjunto de medidas que tornam alguém
livre de uma doença ou de um problema de saúde.
Mas a
palavra latina tem outro, e mais amplo sentido.
"Curar" é
"cuidar".
E isto é importante porque, em primeiro lugar, nem todas as
doenças podem ser simplesmente eliminadas.
À medida que
aumenta a expectativa de vida, e que as pessoas chegam a idades mais avançadas,
aumenta o número de problemas crônicos para os quais não existe solução
definitiva e que exigem, portanto, cuidados constantes.
Por outro
lado, mesmo quando existe cura no sentido de um medicamento ou procedimento
eficaz, é preciso que alguém auxilie o doente a fazer uso desse medicamento ou
procedimento.
Portanto,
precisamos de cuidadores, e cada vez mais precisamos deles.
O que torna
uma pessoa cuidadora?
Alguém dirá
que se trata de uma vocação especial. Isto existe em muitos casos, mas não
basta.
Cuidar não é
apenas questão de generosidade, é questão de técnica, de conhecimento.
E exige
dedicação.
Os dias se
passam, as semanas, os anos, e os problemas que invalidam a pessoa, que a fazem
sofrer estão ali presentes, às vezes melhorando, às vezes se agravando.
Isto
significa que a pessoa precisa renovar, às vezes diariamente, às vezes hora a
hora, a sua disposição para cuidar do outro.
Ou seja: os
cuidadores precisam ser cuidados.
Há muitas
maneiras de fazê-lo, desde o treinamento até formas de suporte psicológico.
Mas quem tem
experiência nesta área sabe: uma coisa que funciona é a gratidão. A gratidão
da pessoa que está sendo cuidada, de seus familiares, de seus amigos.
Um simples
"obrigado" pode fazer muito pelo cuidador ou pela cuidadora.
Esta palavra
é, ela própria, um cuidado, uma verdadeira cura para os revezes que encontramos
em nossa existência e em nosso trabalho, particularmente quando este diz
respeito à doença.
Cuidemos dos
cuidadores.
Assim
estaremos cuidando de nós mesmos e da humanidade como um todo.
* * *
02 julho 2014
O homem no mundo
Podemos, por um determinado tempo de nossa vida material,
que pode ser de maior ou menor duração, viver de forma descuidada, indiferente,
sem a menor noção de solidariedade, vivendo somente para nós, esquecidos de
tudo e de todos que nos cercam.
Uma vida egoísta, onde tudo que interessa são as satisfações
de nossas vontades, e nada mais.
Mas... existe sempre um mas... na vida de cada um - chega
para todos aquele momento em que se acende uma luzinha vermelha em nossas
mentes, e passamos a nos perguntar: "Afinal, quem realmente sou eu? O que
estou fazendo no mundo? De onde vim? Para onde vou? Qual a minha
destinação?"
São perguntas que brotam na mente de todos, uma a uma, em
determinado momento da vida.
Essas considerações, essas perguntas que passam a martelar a
mente do ser humano, podem demorar a chegar, mas chegam.
Para atingir este estágio, o homem pode consumir mesmo
muitas existências - de forma que, de experiência em experiência, de luta em
luta, de queda em queda, vai moldando seu caráter.
Em um dos muitos diálogos com seus discípulos, Jesus exortou
a todos: "Sede perfeitos, como perfeito é o vosso Pai Celestial".
Evidentemente, o Mestre não queria, com tal exortação, dizer que todos podem
chegar à perfeição do Pai Celestial. Deus é um só, é único, é onipotente, é a
causa primária de todas as coisas, e a criatura jamais poderá igualar-se ao
Criador.
O que certamente Jesus quis dizer é que todos possuímos
dentro de nós um potencial de crescimento espiritual que nós mesmos
desconhecemos, e que muito, muito mesmo, poderemos fazer, dentro daquilo que
Ele pregou e exemplificou.
Mas... como chegar a esse estágio de perfeição relativa face
à perfeição absoluta de Deus?
As lutas a que somos compelidos a enfrentar no mundo, as
desavenças, as incompreensões, as atitudes alheias que nos chocam, as pessoas,
com grau de parentesco ou não, que gozam de nossa intimidade, que vivem conosco
o dia-a-dia, e que tantas vezes agem de forma a agredir ou contrariar nosso
modo de ser e pensar, são outros tantos obstáculos a impedir ou retardar nosso
esforço no bem.
Como vencer tudo isso, como superar tantos obstáculos, se a
vida material nos oferece tão somente algumas dezenas de anos de existência?
Cinqüenta, sessenta, oitenta ou até mesmo cem anos constituem um espaço de tempo
muito pequeno para que tenhamos condições de atingir um grau tal de tolerância,
de paciência, tamanha capacidade de perdão, para amar os que nos odeiam,
perdoar os que nos ofendem, abraçar os que nos traíram, compreender no irmão
faltoso o irmão necessitado de compreensão e carinho.
Foi para responder tantas perguntas, esclarecer tantas
dúvidas, que Allan Kardec, sob a orientação de Espíritos superiores, codificou
a Doutrina Espírita, interpretando com clareza o pensamento de Jesus.
Não resta a menor dúvida que, baseando-nos no raciocínio
simplista de uma só existência, torna-se praticamente impossível conciliar
alguns ensinamentos de Jesus com a realidade da vida, ao passo que, com a
reencarnação, sublime concessão de Deus para com todos os seus filhos faltosos,
tudo se esclarece, tudo se torna de fácil entendimento.
Com a Lei dos Renascimentos, já não somos os condenados ao
sofrimento eterno.
Todos nós, Espíritos falíveis, estamos sujeitos a cometer
erros, e somente a certeza da reencarnação nos fortalece para prosseguir a
caminhada.
O próprio Apóstolo Paulo, num rasgo de humildade, exclamou:
"Sinto que faço o mal que não quero, mas não faço o bem que desejo",
sintetizando, naquele momento, as dificuldades que encontramos pelo caminho.
Mas, para demonstrar que temos condições de superar todos os
obstáculos da caminhada. afirmou em outra ocasião: "Alegrai-vos na
esperança, sede pacientes na tribulação, perseverai na oração".
E
exortando os discípulos a atitudes corajosas, afirmou: "Em tudo somos
atribulados, mas não angustiados; perplexos, mas não desanimados; perseguidos,
mas não desamparados; abatidos, mas não destruídos".
E no final da
jornada, afirmou: "Combati o bom combate, terminei minha tarefa, conservei
a fé".
A fidelidade, a coragem e a perseverança do Grande Apóstolo
foram a mola propulsora do Cristianismo no mundo, e poderão ser, também, a mola
propulsora do nosso crescimento espiritual.
(Dilton Pereira)
Texto extraído do Jornal "Macaé Espírita" - maio e
junho/98.
(Jornal Mundo Espírita de Agosto de 1998)
* * *
Kahlil Gibran e a morte...
Vós conheceis o segredo da morte.
Mas como o encontrareis a menos que o procureis no âmago do
coração?
O mocho cujos olhos noturnos são cegos para a claridade, não
pode desvendar o mistério da luz.
Se quereis verdadeiramente conhecer o espírito da morte,
abri o vosso coração até ao corpo da vida.
Pois vida e morte são uma só, tal como o são o rio e o mar.
Na profundeza dos vossos desejos e esperanças está a
consciência silenciosa do além; e tal como as sementes que sonham sob a neve,
também o vosso coração sonha com o desabrochar.
Confiai nos sonhos, pois neles está a porta para a
eternidade.
O vosso medo da morte não é mais do que o temor do pastor
quando se vê perante o rei que ergue a sua mão para o honrar.
E sob a sua tremura, não está feliz o pastor, por trazer em
si a insígnia do rei?
E, no entanto, não está mais consciente do seu tremor?
Pois o que é morrer senão ficar nu ao vento e fundir-se com
o sol?
E o que é deixar de respirar senão libertar a respiração das
suas inquietações a fim de ela poder elevar-se e expandir-se até Deus?
Só quando beberdes do rio do silêncio sereis capazes de
cantar.
E quando chegardes ao cimo da montanha, podereis então
começar a subir.
E quando a terra reclamar o vosso corpo, então sereis
verdadeiramente capazes de dançar.
(Kahlil
Gibran, in “O Profeta”
)
* * *
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