"Nós não somos seres humanos tendo uma experiência espiritual. Somos seres espirituais tendo uma experiência humana"

(Teillard de Chardin)

30 agosto 2014

O último adeus - uma declaração de amor através da Arte




A escultura “O último adeus”, de Alfredo Oliani, está no túmulo da Família Cantarella, no Cemitério São Paulo.  (...)

Ao nos depararmos com o enorme casal de bronze representado em “O último adeus”, a primeira idéia que vem à mente é de um homem que perdeu a mulher amada.

É isso que vemos. Um homem jovem, vigoroso, nu (os detalhes perfeitos da musculatura impressionam) beijando uma mulher, também jovem, de olhos fechados, já morta.

Mas, na realidade, aconteceu o contrário.

A obra foi encomendada por Maria Cantarella, viúva de Antonino Cantarella, falecido em 1942.

Os papéis são invertidos. Parece-me que ela quis representar não só a imortalidade do amor e da paixão do casal, mas apresentar, principalmente, a quem vê o monumento, o homem de sua vida em todo seu vigor, pleno, vivo.

E ela, morta.

Talvez seja uma representação mais perfeita da saudade.

Quem fica é condenado a uma morte em vida.

“Ao Nino, meu esposo, meu guia e motivo eterno de minha saudade e de meu pranto” - são os dizeres na lápide ao lado.

Maria, dez anos mais jovem, só se juntaria ao amado quatro décadas depois.

*

Sempre gosto de lembrar: cemitérios são museus.

Além das interpretações que a história – contrária ao que se vê – pode gerar, surgem outras dúvidas.

Infelizmente, a ação de vândalos contribui em muito para apagar os registros históricos mais visíveis.

Muitas vezes, o visitante comum sequer saberá quando o homenageado nasceu ou faleceu, já que os números ou placas com datas são arrancados.

No caso de “O último adeus”, isso me chamou bastante atenção.

Na sepultura, a data de morte de Nino aparecia da seguinte maneira: 23-*2-1*4* (onde os asteriscos representam os números arrancados).

Tudo que se poderia dizer é que havia morrido na antevéspera do Natal de algum ano na década de 1940. 

Mas há uma informação que confunde ainda mais. Na base do monumento, lê-se: A. OLIANI – S. PAULO 30-06-928. Como a estátua teria sido feita em 1928 (não há o “1” no entalhe) se foi encomendada após a morte de Nino, em 1942?

Um pouco mais de conhecimento histórico-biográfico e a confusão aumenta.

Em 1928, Alfredo Oliani tinha apenas 22 anos de idade e estava iniciando seus estudos. 

Obra criada em 1928, mas só executada em 1942 após a encomenda? Entalhe feito posteriormente com data errada?

A atenção a esses detalhes levam a novas visitas, às buscas nos arquivos dos cemitérios, ao estudo da vida e da obra dos artistas, à familiarização com seu estilo, ao reconhecimento de outras obras sem que se precise conferir a assinatura…

Histórias pessoais e História da Arte é o que encontramos em cemitérios. 

São cheios de vida e de vidas. 


(texto de Sandro Fortunato)






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