Houve uma época em que trabalhei como socorrista.
Dependendo do planejamento dos nossos Superiores, haviam semanas em que nosso grupo descia aos umbrais e à crosta terrestre diariamente.
Geralmente tínhamos uma lista de objetivos, onde deveríamos recolher alguns e tentar resgatar outros, trazendo-os conosco e encaminhando-os a determinadas colônias.
Era muito comum, no correr de nossas missões, fazermos uma ronda na área em busca de outros desencarnados que, embora fora de nossa lista de objetivos, estivessem em condições de nos compreender e de receber ajuda.
Nestes casos, a decisão cabia ao líder do grupo, geralmente um Irmão mais adiantado e que tinha, portanto, mais discernimento e mais facilidade em receber as intuições do Alto mesmo em ambientes pesados e muitas vezes hostis.
Por muitos anos prestei este tipo de serviço, trabalhando com alegria e dedicação.
E, neste tempo todo, houve um caso em particular que me prendeu a atenção, caso este que gostaria de narrar nesta oportunidade.
Aconteceu em meados da década de 70.
Naquela tarde de sábado, uma vez cumprida nossa lista de objetivos,estávamos nos preparando para retornar ao Plano Espiritual.
Foi quando percebi a entrada de um cortejo fúnebre no cemitério onde há pouco havíamos recolhido alguns irmãos.
Minha atenção foi imediatamente voltada para um rapaz que, cabisbaixo, seguia o féretro.
Seria mais um na multidão não fosse o fato de que meus olhos podiam vislumbrar o cordão prateado pendendo de seu corpo e ligando-se com o corpo sem vida dentro do caixão. E a coloração escurecida do cordão dizia-me que seu desencarne ocorrera de forma violenta e prematura.
Fiz menção de aproximar-me na tentativa de ajudá-lo, mas o líder do grupo deteve-me, por julgar que o rapaz não estava ainda preparado para ser removido dali.
Semanas se passaram até que eu voltasse àquele cemitério com meu grupo de socorro.
Fiquei surpreso e com o coração apertado ao ver o rapaz parado a contemplar o próprio túmulo.
Aproximei-me e percebi que ele não conseguiria notar minha presença.
Sua mente fixava-se no momento de seu desencarne, mas um bloqueio criado a partir de suas crenças e valores pessoais o impediam de compreender que, apesar de tudo permanecia vivo.
Era possível ver nitidamente em sua tela mental o conflito em seu coração, pois não podia compreender o que o prendia ali e nem mesmo tinha a clareza de que aquele era seu próprio jazigo.
Eu estava ali e nada podia fazer para auxiliá-lo. Orei, pedido a Jesus pelo rapaz e parti.
Diversas vezes, ao longo de anos, voltei a aquelas paragens para resgatar irmãos desencarnados e lá estava o rapaz, como se já fizesse parte da paisagem.
Ora em pé, ora sentado sobre a tumba.
Nada via ou ouvia, senão seus próprios pensamentos.
E eu, em todas as oportunidades, aproximava-me dele e fazia uma prece a seu favor.
A esta altura eu sabia que seu resgate seria difícil. Após inúmeros encontros onde tantas vezes eu já havia acessado seus pensamentos, ficou muito claro que sua consciência o acusava de ter abreviado a própria vida, o que enchia de remorso e tristeza seu coração.
A mim, só restava ter fé e paciência.
Finalmente, após muita preparação e muito estudo, fui autorizado a tentar uma aproximação mais direta.
Abaixei o máximo que pude meu padrão vibratório e contando com a sustentação de meu grupo de socorro e com o apoio psíquico de um grupo de trabalhadores encarnados, consegui ser notado por ele.
Por breves momentos, consegui tirá-lo do transe e que permanecia há anos.
Trocamos algumas palavras e ele voltou a recolher-se em seu pequeno mundo. Pareceu pouco, mas naquele dia demos um grande passo.
Muitos outros encontros foram necessários, até que Humberto (este era o nome dele) aceitasse minha aproximação e conversasse comigo de forma direta e aberta.
Difícil também foi fazê-lo compreender os fatos e trazê-lo à nossa Colônia. Isto aconteceu há pouco tempo, na virada do milênio.
Deixei de ser socorrista há pelo menos vinte anos, atendendo a outros chamados na Seara de Jesus.
Mas, a ligação afetiva que desenvolvi por aquele rapaz fez com que não abandonasse seu caso.
Hoje Humberto está em tratamento intensivo, mas provavelmente não terá condições de adaptar-se á vida espiritual.
Por esta razão, nosso mentores estão preparando-o para a reencarnação, onde ela não se furtará de um corpo enfermo, obtendo assim a bendita oportunidade de redimir-se de seus atos e, queira Deus, retornar fortalecido ao Plano Espiritual.
Estarei a seu lado sempre que me for permitido e farei uma prece em seu favor, como venho fazendo nos últimos trinta anos.
Manoel Dantas *
(Psicografado por Cleber P. Campos)
* Manoel Dantas (1867 - 1924) preside os trabalhos de psicografias desde 2000. Foi um grande educador em sua última jornada na Terra e teria sido médico em uma encarnação anterior.
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